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Alterações da legislação falimentar à luz da Lei nº 14.112/20

Alterações da legislação falimentar à luz da Lei nº 14.112/20

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Este artigo trata das principais alterações da Lei 11.101/2005 trazidas pela Lei 14.112/2-20 para estimular a atividade econômica, mostrando-se que muitos institutos já eram reconhecidos pela jurisprudência.

RESUMO: Este artigo trata das principais alterações na legislação falimentar – Lei nº 11.101/2005, que dispõe sobre os institutos da recuperação judicial e da falência, à luz da Lei nº 14.112/2020. Trata-se de pesquisa exploratória, qualitativa e documental, baseada nas Leis nºs 14.112/20, 11.101/05 e 10.522/02. Quanto aos institutos da recuperação judicial e da falência, destacam-se a prevenção do juízo; as suspensões e proibições pelo prazo de 180 dias; e os procedimentos de verificação e habilitação de créditos. Quanto ao instituto da recuperação judicial, as alterações se relacionam à legitimidade do produtor rural e do grupo econômico por consolidação processual ou substancial; efeitos jurídicos no stay period; dispensa de CND; instauração da constatação prévia; conciliação, mediação e arbitragem; inclusão de outros meios de recuperação judicial; plano de recuperação alternativo dos credores; parcelamento e liquidação de créditos tributários e débitos fiscais ao devedor em recuperação judicial; possibilidade de pagamento dos créditos trabalhistas; alienação e oneração de bens durante a recuperação judicial; financiamento ao devedor; inclusão dos credores trabalhistas no plano de recuperação extrajudicial; redução do quórum de aprovação de citado plano. Em relação ao instituto da falência, as mudanças dizem respeito ao detalhamento dos objetivos da falência; possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica; credores concursais e extraconcursais; realização do ativo; encerramento e extinção das obrigações; e insolvência transnacional; dentre outras. Verifica-se que as mudanças da legislação falimentar visam dar maior celeridade aos processos de recuperação judicial e de falência, de modo a estimular a atividade econômica, à medida em que possibilita alternativas de resolução da crise econômico-financeira da empresa e o retorno do falido ao mercado.

Palavras-Chave: Legislação falimentar. Lei 14.112/20. Alterações.


1. INTRODUÇÃO

Este artigo trata das principais alterações da legislação falimentar – Lei nº 11.101/2005 à luz da Lei nº 14.112/2020. A Lei nº 11.101/2005 dispõe sobre os institutos da recuperação judicial e extrajudicial e da falência ao empresário e à sociedade empresária. As empresas vinham apresentando dificuldades para superar a crise econômico-financeira em que se encontravam, o que foi agravado em função da pandemia de covid-19. Nesse contexto, a reforma da legislação falimentar apoia-se no aprimoramento dos institutos da recuperação judicial e extrajudicial e da falência, no sentido de viabilizar ou não a continuidade das empresas no mercado. Dessa forma, pretende-se responder a seguinte pergunta de pesquisa: Quais as principais alterações promovidas na legislação falimentar a partir da Lei nº 14.112/20? Desse modo, o objetivo desse artigo é apresentar as alterações da legislação falimentar promovidas pela Lei 14.112/20 em relação aos institutos da recuperação judicial e extrajudicial e da falência. Trata-se de pesquisa exploratória, qualitativa e documental, baseada na Leis nºs 14.112/20, 11.101/05 e 10.522/02. O artigo destaca as principais alterações e os respectivos artigos da legislação falimentar reformada que atingem tanto a recuperação judicial e extrajudicial e à falência, quanto em relação a cada instituto, especificamente. Apresenta-se, ao final, a conclusão e as referências.


2. ALTERAÇÕES QUANTO AOS INSTITUTOS DA RECUPERAÇÃO E DA FALÊNCIA

Prevenção do juízo em face da distribuição do pedido de falência, de recuperação judicia ou de homologação de recuperação extrajudicial (art. 6º §§ 8º e 9º): A distribuição do pedido de falência ou de recuperação judicial ou a homologação de recuperação extrajudicial previne a jurisdição para qualquer outro pedido de falência, de recuperação judicial ou de homologação de recuperação extrajudicial relativo ao mesmo devedor (art. 6º § 8º). O devido processamento não obsta a eficácia da convenção arbitral, não impedindo ou suspendendo a instauração do procedimento arbitral (art. 6º § 9º).

Suspensões e proibições em decorrência do processamento da recuperação judicial ou da decretação da falência (art. 6º I a III): A partir da reforma da legislação falimentar, o deferimento da recuperação judicial, assim como a decretação da falência, implica em: suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor sujeitas ao regime falimentar; suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor e daquelas dos credores particulares do sócio solidário, sujeitos à ao regime falimentar; e proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência (art. 6º I a III). Entende-se que a proibição de atos de constrição promoverá mobilidade para conversão do patrimônio em garantia de eventuais empréstimos, para fins de entrada de capital na empresa.   

Verificação e habilitação de créditos (arts. 10 §§ 7º a 10º; 16 e § 2º): O quadro geral de credores poderá ser formado a partir do julgamento das impugnações tempestivas e das habilitações e impugnações retardatárias decididas até o momento da sua formação, ou seja, independentemente da conclusão desses atos (art. 10 § 7º). As habilitações e as impugnações retardatárias acarretarão a reserva do valor para a satisfação do crédito discutido (art. 10 § 8º). No caso da recuperação judicial, optando-se pela celeridade do processo, ainda que não tenha havido a consolidação definitiva do quadro-geral de credores, poderá ser encerrado o processo de recuperação judicial, hipótese em que as ações incidentais de habilitação e de impugnação retardatárias serão redistribuídas ao juízo da recuperação judicial como ações autônomas e pelo rito comum (art. 10 § 9º).  No caso da falência, o credor deverá apresentar pedido de habilitação ou de reserva de crédito em, no máximo, três anos, contados da data de publicação da sentença que decretar a falência, sob pena de decadência (art. 10 § 10). Para fins de rateio na falência, deverá ser formado quadro-geral de credores, composto pelos créditos não impugnados, pelo julgamento de todas as impugnações apresentadas no prazo previsto na legislação falimentar (art. 8º) e pelo julgamento realizado até então das habilitações de crédito recebidas como retardatárias (art. 16). Destaca-se que, ainda que o quadro-geral de credores não esteja formado, o rateio de pagamentos na falência poderá ser realizado desde que a classe de credores a ser satisfeita já tenha tido todas as impugnações judiciais apresentadas no prazo previsto, ressalvada a reserva dos créditos controvertidos em função das habilitações retardatárias de créditos distribuídas até então e ainda não julgadas (art. 16 § 2º).


3. ALTERAÇÕES QUANTO AO INSTITUTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Recuperação judicial de produtor rural (arts. 48 §§ 2º, 3º; 49 §§ 6º, 7º; 8º, 9º; 70-A): O produtor rural pode pedir a recuperação judicial, seja pessoa física ou pessoa jurídica. No caso de pessoa jurídica, independentemente, do registro na Junta Comercial, admite-se a comprovação do prazo de atividade rural de dois anos por meio da Escrituração Contábil Fiscal (ECF) ou através de obrigação legal de registros contábeis que venha a substituir a ECF, entregue tempestivamente (art. 48 § 2º). Já, a comprovação do referido prazo por pessoa física, será feito com base no Livro Caixa Digital do Produtor Rural (LCDPR) ou mediante a obrigação legal de registros contábeis que venha a substituir o LCDPR, e pela Declaração do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (DIRPF) e balanço patrimonial, todos entregues tempestivamente (art. 48 § 3º). Somente estarão sujeitos à recuperação judicial os créditos que decorram exclusivamente da atividade rural, ainda que não vencidos. Não estão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial os recursos controlados e abrangidos por crédito rural (arts. 14 e 21, Lei nº 4.829/65) (art. 49 § 7º). Contudo, esses créditos estarão sujeitos à recuperação judicial se não tiverem sido objeto de renegociação entre o devedor e a instituição financeira antes do pedido de recuperação judicial, na forma de ato do Poder Executivo (art. 49 § 8º). Ainda, não se sujeitam à recuperação judicial os créditos relativos a dívidas constituídas nos três últimos anos anteriores ao pedido de recuperação judicial, que tenham sido contraídas com a finalidade de aquisição de propriedades rurais, bem como as respectivas garantias (art. 49 § 9º). Ademais, produtor rural pessoa física pode optar pelo plano de recuperação especial, desde que não envolva crédito superior a R$ 4,8 milhões (art. 70-A).

Recuperação judicial de grupo econômico e consolidação processual e substancial (art. 69-G a 69-L): Os devedores que atendem os requisitos da legislação falimentar e que integram grupo sob controle societário comum podem requerer a recuperação judicial sob consolidação processual (art. 69-G), que implica na coordenação de atos processuais, restando garantida a independência dos devedores, dos seus ativos e dos seus passivos (art. 69-I). Nesse caso, os devedores proporão meios de recuperação independentes e específicos para a composição de seus passivos, admitida a sua apresentação em plano único, enquanto os credores de cada devedor deliberarão em assembleias-gerais de credores independentes. Contudo, a consolidação processual não impede que alguns devedores obtenham a concessão da recuperação judicial e outros tenham a falência decretada (art. 69-I §§ 1º, 2º e 4º). Outrossim, o Juiz poderá, excepcionalmente, independentemente da realização de assembleia geral, autorizar a consolidação substancial de ativos e passivos dos devedores integrantes do mesmo grupo econômico que estejam em recuperação judicial sob consolidação processual, caso em que os ativos e os passivos serão tratados como se pertencessem a um único devedor, apenas quando constatar a interconexão e a confusão entre ativos ou passivos dos devedores, de modo que não seja possível identificar a sua titularidade sem excessivo dispêndio de tempo ou de recursos, cumulativamente com a ocorrência de, no mínimo, duas das seguintes hipóteses: existência de garantias cruzadas; relação de controle ou de dependência;  identidade total ou parcial do quadro societário; ou atuação conjunta no mercado entre os postulantes (art. 69-J, I a IV; 69-K). Admitida a consolidação substancial, os devedores apresentarão plano unitário, que discriminará os meios de recuperação a serem empregados e será submetido a uma assembleia-geral de credores para a qual serão convocados os credores dos devedores.  Nesse caso, a rejeição do plano unitário pela assembleia geral de credores acarretará a convolação da recuperação judicial em falência dos devedores sob consolidação substancial (art. 69-L e § 2º).

Conciliação e mediação antecedente ou incidente ao processo de recuperação judicial (arts. 20-A a 20-D):  A conciliação e a mediação serão incentivadas em qualquer grau de jurisdição, inclusive no âmbito de recursos em segundo grau de jurisdição e nos Tribunais Superiores, e não implicarão a suspensão dos prazos previstos, salvo se houver consenso entre as partes em sentido contrário ou determinação judicial (art. 20-A). Admitem-se esses institutos  nas fases pré-processual e processual de disputas entre os sócios e acionistas de sociedade em dificuldade ou em recuperação judicial, bem como nos litígios que envolverem credores não sujeitos à recuperação judicial ou credores extraconcursais; em conflitos que envolverem concessionárias ou permissionárias de serviços públicos em recuperação judicial e órgãos reguladores ou entes públicos municipais, distritais, estaduais ou federais;  ainda no caso de haver créditos extraconcursais contra empresas em recuperação judicial durante período de vigência de estado de calamidade pública, a fim de permitir a continuidade da prestação de serviços essenciais;  e na hipótese de negociação de dívidas e respectivas formas de pagamento entre a empresa em dificuldade e seus credores, em caráter antecedente ao ajuizamento de pedido de recuperação judicial (art. 20-B I a IV). Admite-se tutela de urgência para suspender as execuções em face do devedor pelo prazo de até 60 dias antes do ajuizamento da recuperação judicial, na tentativa de composição com seus credores em procedimento de mediação ou conciliação já instaurado perante o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC). Em caso de pedido de recuperação judicial ou extrajudicial subsequente, o prazo será deduzido do stay period (art. 20-B, §§ 1º e 3º). Não é possível tratar sobre natureza e classificação de créditos e critérios de votação em Assembleia Geral de Credores (AGC) em conciliação e mediação (art. 20-B § 2º).  O acordo obtido por meio de conciliação ou de mediação deverá ser homologado pelo juízo competente (art. 20-C). Se houver pedido de recuperação judicial ou extrajudicial em até 360 dias contados do acordo firmado na conciliação ou mediação pré-processual, os direitos e garantias dos credores serão reconstituídos nas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos e ressalvados os atos validamente praticados no âmbito dos procedimentos legais. As sessões de conciliação e de mediação poderão ser realizadas por meio virtual, desde que o CEJUSC do Tribunal competente ou a câmara especializada responsável disponham de meios para a sua realização (art. 20-D). O processamento da recuperação judicial ou a decretação da falência não autoriza o administrador judicial a recusar a eficácia da convenção de arbitragem, não impedindo ou suspendendo a instauração de procedimento arbitral (art. 6º, § 9º).

Instituição da constatação prévia no instituto da recuperação judicial (art. 51-A §§ 1º a 7º):  Se achar necessário, o juiz poderá nomear profissional de sua confiança, com capacidade técnica e idoneidade, com remuneração arbitrada pelo juiz, com base na complexidade do trabalho realizado, que consiste na constatação, exclusivamente, das reais condições de funcionamento do devedor requerente e da regularidade e da completude da documentação apresentada com a petição inicial (art. 51-A §§ 1º, 2º). Destaca-se que é vedado o indeferimento do processamento da recuperação judicial baseado na análise de viabilidade econômica do devedor (art. 51-A § 5º). No entanto, se forem detectados indícios contundentes de utilização fraudulenta da ação de recuperação judicial, o juiz poderá indeferir a petição inicial e oficiar ao Ministério Público para tomada das providências criminais eventualmente cabíveis (art. 51-A § 6º). Restando demonstrado que o principal estabelecimento do devedor não se situa na área de competência do juízo, o juiz determinará a remessa dos autos, com urgência, ao juízo competente (art. 51-A § 7º).   

Impossibilidade de distribuição de lucros e dividendos aos sócios, sob pena de crime (art. 6º-A): Até a aprovação do plano de recuperação judicial, é vedado ao devedor distribuir lucros ou dividendos a sócios e acionistas, sujeitando-se o infrator ao crime previsto na legislação falimentar (art. 168), pelo qual considera-se  ato fraudulento de que resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, com o fim de obter ou assegurar vantagem indevida para si ou para outrem, como pena de reclusão, de três a seis anos, e multa (arts. 6º-A e 168).

Possibilidade de prorrogação do stay period na recuperação judicial (art. 6º §§ 4º e 4º-A): Na recuperação judicial, o stay period de cento e oitenta dias, período em que ocorrem as suspensões da prescrição das obrigações e das execuções em face do devedor e as proibições de atos de constrição, contado do deferimento do processamento da recuperação, pode ser prorrogado por igual período, uma única vez, em caráter excepcional, desde que o devedor não haja concorrido com a superação do lapso temporal, ou seja, desde que a impossibilidade de votação do plano não seja atribuída à recuperanda (art. 6º § 4º). Ademais, esse período poderá ser prorrogado uma segunda vez, se os credores aprovarem a apresentação de plano de recuperação judicial alternativo, no caso de rejeição do plano apresentado pelo devedor (arts. 6º, § 4º-A e 56, § 4º) (art. 6º, §§ 4º e 4º-A). Além disso, o juiz poderá antecipar total ou parcialmente os efeitos do deferimento do processamento da recuperação judicial, o que permite o pedido de tutela de urgência, expressamente prevista, visando a antecipação dos efeitos jurídicos, como os decorrentes do stay period, antes mesmo do deferimento do processamento do pedido (art. 6º § 12).

Substituição de assembleia geral por termo de adesão ou votação eletrônica e voto abusivo (art. 39 § 4º I a III, §§ 5º e 6º):  Qualquer deliberação a ser realizada por meio de assembleia-geral de credores poderá ser substituída, com idênticos efeitos, por termo de adesão firmado por tantos credores quantos satisfaçam o quórum de aprovação específico, ou seja, mais da metade do valor dos créditos sujeitos à recuperação judicial, observadas as exceções legais (art. 45-A); votação realizada por meio de sistema eletrônico que reproduza as condições de tomada de voto da assembleia-geral de credores; ou outro mecanismo reputado suficientemente seguro pelo juiz (art. 39 § 4º I a III). Essas deliberações serão fiscalizadas pelo administrador judicial, que emitirá parecer sobre sua regularidade, previamente à sua homologação judicial, independentemente da concessão ou não da recuperação judicial (art. 39 § 5º). O voto será exercido pelo credor no seu interesse e de acordo com o seu juízo de conveniência e poderá ser declarado nulo por abusividade somente quando manifestamente exercido para obter vantagem ilícita para si ou para outrem (art. 39, § 6º).

Inclusão de outros meios de recuperação judicial (art. 50, XVII e XVIII):  Foram incluídos mais dois meios de recuperação judicial – conversão de dívida em capital social (art. 50 VII) e venda integral da devedora, desde que garantidas aos credores não submetidos ou não aderentes condições, no mínimo, equivalentes àquelas que teriam na falência, hipótese em que será, para todos os fins, considerada unidade produtiva isolada (art. 50 XVIII). Não haverá sucessão ou responsabilidade por dívidas de qualquer natureza a terceiro credor, investidor ou novo administrador em decorrência, respectivamente, da mera conversão de dívida em capital, de aporte de novos recursos na devedora ou de substituição dos administradores desta (art. 50, § 3º).

Inclusão de outros documentos na petição inicial de recuperação judicial (art. 51, e, III, IX, X, XI): Foram incluídos outros documentos para compor a instrução da petição inicial de recuperação judicial,  devendo-se apresentar, além dos listados antes da reforma, os seguintes: descrição das sociedades do grupo societário, de fato ou de direito (art. 51 e); relação nominal completa dos credores, sujeitos ou não à recuperação judicial, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço físico e eletrônico de cada um, a natureza e o valor atualizado do crédito, com a discriminação de sua origem, e o regime dos vencimentos (art. 51 III);  relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais e procedimentos arbitrais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados (art. 51 IX); relatório detalhado do passivo fiscal (art. 51, X); e relação de bens e direitos integrantes do ativo não circulante, incluídos aqueles não sujeitos à recuperação judicial, acompanhada dos negócios jurídicos celebrados com os credores com direito de propriedade (art. 49 § 3º) (art. 51 XI). 

Dispensa de apresentação da Certidão Negativa de Débitos pelo devedor em recuperação judicial para contratação com a Administração Pública (art. 52, II): Em relação às determinações judiciais decorrentes do deferimento do processamento da recuperação, a partir da reforma da legislação, o juiz determinará a dispensa da apresentação de Certidão Negativa de Débitos (CND) ou positiva com efeitos de negativa para que o devedor exerça suas atividades, cessando-se também a exigência para fins de recebimento de valores, participação em licitações ou outras contratações com a Administração Pública, o que antes da reforma não era possível (art. 52, II).

Plano de recuperação judicial alternativo dos credores (art. 56, § 4º): A partir da reforma da legislação falimentar, o devedor passa a contar com mais uma possibilidade de concessão da recuperação judicial, no caso de rejeição do plano de recuperação pela assembleia geral de credores. Trata-se do plano alternativo dos credores. Desse modo, sendo reprovado o plano de recuperação judicial do devedor, o administrador judicial submeterá, no ato, à votação da assembleia-geral de credores a concessão de prazo de 30 (trinta) dias para que seja apresentado plano de recuperação judicial pelos credores, devendo haver aprovação por credores que representem mais da metade dos créditos presentes à assembleia-geral (art. 56 §§ 4º e 5º). O plano de recuperação judicial proposto pelos credores somente será posto em votação caso satisfeitas, cumulativamente, as seguintes condições: ausência dos requisitos para a decisão assemblar-judicial (art. 58 § 1º, I a III); preenchimento dos requisitos do plano de recuperação do devedor (art. 53, I a III); apoio por escrito de credores que representem, alternativamente, mais de 25% dos créditos totais sujeitos à recuperação judicial ou mais de 35% dos créditos dos credores presentes à assembleia-geral (art. 56 § 4º); não imputação de obrigações novas, não previstas em lei ou em contratos anteriormente celebrados, aos sócios do devedor; previsão de isenção das garantias pessoais prestadas por pessoas naturais em relação aos créditos a serem novados e que sejam de titularidade dos credores apoiadores ou daqueles que votarem a favor do plano alternativo, não permitidas ressalvas de voto; e não imposição ao devedor ou aos seus sócios de sacrifício maior do que aquele que decorreria da liquidação na falência (art. 56 § 6º I a VI). O plano de recuperação alternativo poderá prever a capitalização dos créditos, inclusive com a consequente alteração do controle da sociedade devedora, permitido o exercício do direito de retirada pelo sócio (art. 56 § 7º). Em sendo rejeitado o plano de recuperação judicial proposto pelos credores, o juiz convolará a recuperação judicial em falência (art. 56 § 8º). Na hipótese de suspensão da assembleia-geral de credores convocada para fins de votação do plano de recuperação judicial, a assembleia deverá ser encerrada no prazo de até noventa dias, contado da data de instalação (art. 56 § 9º). 

Pagamento dos créditos trabalhistas vencidos até a data do pedido de recuperação judicial (art. 54 § 2º, I a III): Mantém-se o pagamento dos créditos trabalhistas de natureza estritamente salarial, até o valor de 5 salários-mínimos vencidos nos últimos três meses, no prazo de até 30 dias. Outrossim, o pagamento dos créditos trabalhistas ou de acidente de trabalho vencidos até a data do pedido de recuperação judicial não pode exceder o prazo de um ano. Contudo, esse prazo pode ser estendido em até 02 anos, se o plano de recuperação judicial atender aos seguintes requisitos, de forma cumulativa: apresentação de garantias julgadas suficientes pelo juiz; aprovação pelos credores titulares de créditos derivados da legislação trabalhista ou decorrentes de acidentes de trabalho; e garantia da integralidade do pagamento dos créditos trabalhistas (art. 54 § 2º, I a III). 

Ampliação do prazo de parcelamento dos créditos tributários e débitos fiscais e outras condições de pagamentos (art. 6º § 7º-B): Aos créditos tributários e débitos fiscais não se aplicam os efeitos jurídicos decorrentes do stay period. Entretanto, admite-se a competência do juízo da recuperação judicial para determinar a substituição dos atos de constrição que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial até o encerramento da recuperação judicial, a qual será implementada mediante a cooperação jurisdicional (art. 6º § 7º-B). Desse modo, apesar de garantida a discricionariedade do juízo da execução fiscal para determinar atos de constrição patrimonial, o juízo da recuperação tem competência para determinar a substituição de tais atos que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial, a ser exercida mediante cooperação jurisdicional. Ademais, as Fazendas Públicas e o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS poderão deferir, nos termos da legislação específica, parcelamento de seus créditos, em sede de recuperação judicial, de acordo com os parâmetros estabelecidos no Código Tributário Nacional (art. 68) e o disposto na Lei 10.522/02 (arts. 10-A, 10-B, 10-C); permitindo-se o parcelamento de débitos em até 120 meses, assim como o parcelamento, com atualização monetária, do Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). Outrossim, havendo descumprimento em relação ao esse parcelamento de débitos ou às transações legais efetuadas, como também se for identificado esvaziamento patrimonial do devedor que implique liquidação substancial da empresa, em prejuízo de credores não sujeitos à recuperação judicial, há possibilidade de o fisco requerer a convolação da recuperação judicial do devedor em falência (art. 73 V e VI).

Autorização judicial para alienação ou oneração de bens ou direitos do ativo não circulante do devedor em recuperação judicial (arts. 66 §§ 1º a 4º; 66-A; 67 e § único): Após a distribuição do pedido de recuperação judicial, o devedor não poderá alienar ou onerar bens ou direitos de seu ativo não circulante, salvo autorização do juiz, depois de ouvido o Comitê de Credores, se houver, com exceção daqueles previamente autorizados no plano de recuperação judicial (art. 66 § 1º). Em sendo autorizada a alienação pelo juiz, devem-se observar os seguintes procedimentos: nos cinco dias subsequentes à data da publicação da decisão, credores que corresponderem a mais de 15% do valor total de créditos sujeitos à recuperação judicial, comprovada a prestação da caução equivalente ao valor total da alienação, poderão manifestar ao administrador judicial, fundamentadamente, o interesse na realização da assembleia-geral de credores para deliberar sobre a realização da venda; e nas quarenta e oito horas posteriores ao final desse primeiro prazo (de cinco dias), o administrador judicial apresentará ao juiz relatório das manifestações recebidas e, somente na hipótese de cumpridos os requisitos estabelecidos, requererá a convocação de assembleia-geral de credores, que será realizada da forma mais célere, eficiente e menos onerosa, preferencialmente por intermédio de termo de adesão ou votação eletrônica (art. 39 § 4º) (art. 66 § 1º I e II). A alienação, realizada com observância do disposto na legislação falimentar (arts. 141 § 1º e 142), estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do adquirente nas obrigações do devedor, incluídas, mas não exclusivamente, as de natureza ambiental, regulatória, administrativa, penal, anticorrupção, tributária e trabalhista (art. 66 § 3º). Outrossim, a alienação de bens ou a garantia outorgada pelo devedor a adquirente ou a financiador de boa-fé, desde que realizada mediante autorização judicial expressa ou prevista em plano de recuperação judicial ou extrajudicial aprovado, não poderá ser anulada ou tornada ineficaz após a consumação do negócio jurídico com o recebimento dos recursos correspondentes pelo devedor (art. 66-A). Ademais, os créditos decorrentes de obrigações contraídas pelo devedor durante a recuperação judicial, inclusive aqueles relativos a despesas com fornecedores de bens ou serviços e contratos de mútuo, serão considerados extraconcursais, em caso de convolação em falência (art. 67). Ainda, a legislação falimentar reformada prevê tratamento diferenciado aos créditos sujeitos à recuperação judicial de fornecedores de bens ou serviços que continuarem a provê-los normalmente após o pedido de recuperação judicial, desde que tais bens ou serviços sejam necessários para a manutenção das atividades e que referido tratamento seja adequado e razoável no que concerne à relação comercial futura (art. 67 § único).

Financiamento do devedor e do grupo econômico devedor durante a recuperação judicial – DIP Financing (arts. 69-A a 69-F): Trata-se de um mecanismo de investimentos em uma empresa em recuperação judicial para custeio de sua operação rotineira, como salários, fornecedores e demais despesas. Denominado DIP Financing (debtor-in-possesion) (devedor em posse) é um tipo de financiamento para uma empresa que já possui um plano de recuperação aprovado ou em discussão por seus credores para o pagamento de suas dívidas. Refere-se ao financiamento do devedor e do grupo econômico devedor durante a recuperação judicial (art. 69-A a 69-F), sendo considerado como uma das inclusões mais importantes promovidas na legislação falimentar pela Lei 14.112/20. Desse modo, durante a recuperação judicial, o juiz poderá, depois de ouvido o Comitê de Credores, autorizar a celebração de contratos de financiamento com o devedor, garantidos pela oneração ou pela alienação fiduciária de bens e direitos, seus ou de terceiros, pertencentes ao ativo não circulante, para financiar as suas atividades e as despesas de reestruturação ou de preservação do valor de ativos (art. 69-A).   Destaca-se que esse tipo de financiamento não altera a natureza dos créditos, contratos e garantias anteriores, pois a modificação em grau de recurso da decisão autorizativa da contratação do financiamento não pode alterar sua natureza extraconcursal, nem as garantias outorgadas pelo devedor em favor do financiador de boa-fé, caso o desembolso dos recursos já tenha sido efetivado (art. 69-B). Todavia, o juiz poderá autorizar a constituição de garantia subordinada sobre um ou mais ativos do devedor em favor do financiador de devedor em recuperação judicial, dispensando-se a anuência do detentor da garantia original (art. 69-C). Outrossim, a garantia subordinada, em qualquer hipótese, ficará limitada ao eventual excesso resultante da alienação do ativo objeto da garantia original, destacando-se que esse tipo de garanti não se aplica a qualquer modalidade de alienação fiduciária ou cessão fiduciária (art. 69-C §§ 1º e 2º). Ressalta-se que no caso de haver a convolação da recuperação judicial em falência, antes da liberação integral dos valores referentes a citado financiamento, esse contrato será considerado automaticamente rescindido e as garantias constituídas e as preferências serão conservadas até o limite dos valores efetivamente entregues ao devedor antes da data da mencionada sentença de convolação (art. 69-D e § único). O financiamento poderá ser realizado por qualquer pessoa, inclusive credores, sujeitos ou não à recuperação judicial, familiares, sócios e integrantes do grupo do devedor, como também, qualquer pessoa ou entidade pode garantir o financiamento, mediante a oneração ou a alienação fiduciária de bens e direitos, inclusive o próprio devedor e os demais integrantes do seu grupo, estejam ou não em recuperação (arts. 69-E e 69-F).  

Alterações no instituto da recuperação extrajudicial (arts. 161 § 1º; 163 § 7º e 8º e 164): Os créditos trabalhistas e os decorrentes de acidentes de trabalho passam a compor o universo de credores da recuperação extrajudicial, desde que haja negociação coletiva com o sindicato da respectiva categoria profissional (art. 161 § 1º).  Ademais, o quórum de adesão deixará de ser 3/5 e passará a ser 50%; sendo assim, o devedor poderá requerer a homologação de plano de recuperação extrajudicial que obriga todos os credores por ele abrangidos, desde que assinado por credores que representem mais da metade dos créditos de cada espécie abrangidos pelo plano de recuperação extrajudicial (art. 163).  Entretanto, o pedido poderá ser apresentado com comprovação da anuência de credores que representem pelo menos 1/3 (um terço) de todos os créditos de cada espécie por ele abrangidos e com o compromisso de, no prazo improrrogável de noventa dias, contado da data do pedido, atingir o quórum necessário, por meio de adesão expressa, facultada a conversão do procedimento em recuperação judicial a pedido do devedor (art. 163 § 7º). Ressalta-se que a legislação falimentar reformada passou a permitir os efeitos jurídicos decorrentes do stay period (art. 6º) na recuperação extrajudicial, desde o respectivo pedido, exclusivamente, em relação aos créditos por ele abrangidos, devendo ser ratificado pelo juiz se comprovado o quórum inicial exigido (art. 163 §§ 7º e 8º). Ademais, o pedido de homologação do plano de recuperação extrajudicial, será publicado por edital eletrônico com vistas a convocar os credores do devedor para apresentação de suas impugnações, observando-se os procedimentos estabelecidos pela legislação falimentar (art. 163 § 3º, I e II), quanto aos créditos sujeitos à apuração do percentual exigido (art. 164).


4. ALTERAÇÕES QUANTO AO INSTITUTO DA FALÊNCIA

Detalhamento dos objetivos e conceito da falência (art. 75, I a III e §§ 1º e 2º): A partir da reforma, a legislação falimentar estabelece, detalhadamente, os objetivos e o conceito do instituto da falência, destacando que, ao promover o afastamento do devedor de suas atividades, visa a preservar e a otimizar a utilização produtiva dos bens, dos ativos e dos recursos produtivos, inclusive os intangíveis, da empresa; permitir a liquidação célere das empresas inviáveis, com vistas à realocação eficiente de recursos na economia; e fomentar o empreendedorismo, inclusive por meio da viabilização do retorno célere do empreendedor falido à atividade econômica (art. 75 I a III). Além disso, o processo de falência atenderá aos princípios da celeridade e da economia processual, sem prejuízo do contraditório, da ampla defesa e dos demais princípios previstos no Código de Processo Civil (art. 75 § 1º). Destaca-se que o instituto da falência é mecanismo de preservação de benefícios econômicos e sociais decorrentes da atividade empresarial, por meio da liquidação imediata do devedor e da rápida realocação útil de ativos na economia (art. 75 § 2º).   

Proibição da extensão da falência ou de seus efeitos aos sócios de responsabilidade limitada, aos controladores e aos administradores da sociedade falida (art. 82-A e § único): Fica proibida a extensão da falência ou de seus efeitos, no todo ou em parte, aos sócios de responsabilidade limitada, aos controladores e aos administradores da sociedade falida. Contudo, a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade falida, para fins de responsabilização de terceiros, grupo, sócio ou administrador por obrigação desta, somente pode ser decretada pelo juízo falimentar com a observância dos elementos previstos no Código Civil (art. 50 §§ 1º e 2º I a III) e no Código de Processo Civil (arts. 133 a 137), não se suspendendo o processo de falência no caso da instauração do incidente da desconsideração da personalidade jurídica (art. 82-A e § único).

Alteração no rol de créditos concursais na falência (arts. 83 I a IX; e 84 I a V):  Embora a ordem de classificação permaneça a mesma, houve eliminação da classe de credores com privilégio geral e especial, assim considerados em outras normas, pois foram integrados à classe de credores quirografários (art. 83 § 6º); assim como foi incluída a classe de juros vencidos após a decretação da falência (art. 83 IX). Em relação aos créditos subordinados, os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício passam a integrar essa classe somente nos casos em que a contratação não tenha observado as condições estritamente comutativas e as práticas de mercado (art. 83, VIII, b). Sendo assim, a classificação dos créditos na falência obedecerá a seguinte ordem: I – créditos derivados da legislação trabalhista, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos por credor, e aqueles decorrentes de acidentes de trabalho; II – créditos gravados com direito real de garantia até o limite do valor do bem gravado; III – créditos tributários, independentemente da sua natureza e do tempo de constituição, exceto os créditos extraconcursais e as multas tributárias; IV e V, excluídos e integrados na classe VI; VI – créditos quirografários, a saber: a) aqueles não previstos nos demais incisos; b) saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento; e  c) saldos dos créditos derivados da legislação trabalhista que excederem o limite de 150 salários-mínimos;  VII –  multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, incluídas as multas tributárias; VIII – créditos subordinados, a saber: a) os previstos em lei ou em contrato; e b) créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício cuja contratação não tenha observado as condições estritamente comutativas e as práticas de mercado; IX - juros vencidos após a decretação da falência (art. 83 I a IX).  

Alteração no rol de créditos extraconcursais na falência (art. 84 I a V): Os créditos extraconcursais são pagos com precedência sobre os créditos concursais. A reforma da legislação falimentar promoveu alterações no rol de créditos considerados extraconcursais, passando-se a considerar como tais, os seguintes: quantias referentes às despesas cujo pagamento antecipado seja indispensável à administração da falência, inclusive na hipótese de continuação provisória das atividades da empresa, assim como os créditos trabalhistas de natureza estritamente salarial vencidos nos três meses anteriores à decretação da falência, até o limite de cinco salários-mínimos por trabalhador, ambos a serem pagas pelo administrador judicial com os recursos disponíveis em caixa (art. 150 e 151) (art. 84 I-A); valor efetivamente entregue ao devedor em recuperação judicial pelo financiador (art. 84 I-B); créditos em dinheiro objeto de restituição (art. 84 I-C); remunerações devidas ao administrador judicial e aos seus auxiliares, aos reembolsos devidos a membros do Comitê de Credores, e aos créditos derivados da legislação trabalhista ou decorrentes de acidentes de trabalho relativos a serviços prestados após a decretação da falência (art. 84 I-D); obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial ou após a decretação da falência (art. 84 I-E); quantias fornecidas à massa falida pelos credores (art. 84 II); despesas com arrecadação, administração, realização do ativo, distribuição do seu produto e custas do processo de falência (art. 84 III); custas judiciais relativas às ações e às execuções em que a massa falida tenha sido vencida (art. 84 IV); tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência (art. 84 V). (art. 84 I a V).

Modalidades de alienação de bens ou realização do ativo na falência (arts. 142 a 145): A alienação de bens ocorrerá por uma das seguintes modalidades: leilão eletrônico, presencial ou híbrido, observando-se as disposições da legislação falimentar (art. 142 § 3º e 3º-A e 3º-B); processo competitivo organizado promovido por agente especializado e de reputação ilibada, cujo procedimento deverá ser detalhado em relatório anexo ao plano de realização do ativo ou ao plano de recuperação judicial, conforme o caso; qualquer outra modalidade, desde que aprovada nos termos da legislação falimentar (art. 142 I, IV, V). A alienação não dependerá da consolidação do quadro-geral de credores; será realizada independentemente de a conjuntura do mercado no momento da venda ser favorável ou desfavorável, dado o caráter forçado da venda;  devendo ocorrer no prazo máximo de cento e oitenta dias, contado da data da lavratura do auto de arrecadação, no caso de falência; não estará sujeita à aplicação do conceito de preço vil e poderá contar com serviços de terceiros como consultores, corretores e leiloeiros (art. 142 § 2º-A, I a V). Ademais, destaca-se que havendo motivos justificados, o juiz poderá autorizar, mediante requerimento fundamentado do administrador judicial ou do Comitê, modalidades de alienação judicial diversas das previstas na legislação falimentar (art. 144), como também, se restar frustrada a tentativa de venda dos bens da massa falida e não havendo proposta concreta dos credores para assumi-los, os bens poderão ser considerados sem valor de mercado e destinados à doação, e, se não houver interessados na doação, esses bens serão devolvidos ao falido (arts. 144-A e § único). Ainda, os credores poderão adjudicar os bens alienados na falência ou adquiri-los por meio de constituição de sociedade, de fundo ou de outro veículo de investimento, com a participação, se necessária, dos atuais sócios do devedor ou de terceiros, ou mediante conversão de dívida em capital (art. 145).

Condições de encerramento da falência e hipóteses de extinção das obrigações do falido (arts. 156 a 159-A e § único): Apresentado o relatório final, o juiz encerrará a falência por sentença e ordenará a intimação eletrônica às Fazendas Públicas federal e de todos os Estados, Distrito Federal e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento e determinará a baixa da falida no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), expedido pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (art. 156). A extinção das obrigações do falido ocorrerá nas seguintes hipóteses: a) pagamento de todos os créditos; b) pagamento, após realizado todo o ativo, de mais de 25% dos créditos quirografários, facultado ao falido o depósito da quantia necessária para atingir a referida porcentagem se para isso não tiver sido suficiente a integral liquidação do ativo; c) decurso do prazo de três anos, contado da decretação da falência, ressalvada a utilização dos bens arrecadados anteriormente, que serão destinados à liquidação para a satisfação dos credores habilitados ou com pedido de reserva realizado;  d) encerramento da falência em decorrência da apresentação do relatório final do processo pelo administrador judicial (art. 156), ou em virtude da inexistência de bens a serem arrecadados, nos termos do art. 114-A. Nessa hipótese, se não forem encontrados bens para serem arrecadados, ou se os arrecadados forem insuficientes para as despesas do processo, o administrador judicial informará imediatamente esse fato ao juiz, que, ouvido o representante do Ministério Público, fixará, por meio de edital, o prazo de dez dias para os interessados se manifestarem.  Nesse caso, um ou mais credores poderão requerer o prosseguimento da falência, desde que paguem a quantia necessária às despesas e aos honorários do administrador judicial; decorrido o prazo previsto sem manifestação dos interessados, o administrador judicial promoverá a venda dos bens arrecadados no prazo máximo de trinta dias, para bens móveis, e de sessenta dias, para bens imóveis, e apresentará o seu relatório final, que em sendo aprovado, será encerrada a falência pelo juiz nos autos (art. 114-A §§ 1º a 3º). Configurada qualquer das hipóteses de extinção das obrigações, o falido poderá requerer ao juízo da falência que suas obrigações sejam declaradas extintas por sentença (art. 159). Nesse caso, a secretaria do juízo fará publicar imediatamente informação sobre a apresentação do referido requerimento, e, no prazo comum de cinco dias, qualquer credor, o administrador judicial e o Ministério Público poderão manifestar-se exclusivamente para apontar inconsistências formais e objetivas.  Findo o prazo, o juiz, em quinze dias, proferirá sentença que declare extintas todas as obrigações do falido, inclusive as de natureza trabalhista, devendo ser comunicada a todas as pessoas e entidades informadas da decretação da falência (art. 159 §§ 1º a 4º). Essa sentença poderá ser rescindida por ação rescisória, no prazo de dois anos, contado da data do trânsito em julgado da sentença, a pedido de qualquer credor, caso se verifique que o falido tenha sonegado bens, direitos ou rendimentos de qualquer espécie anteriores à data do citado requerimento (art. 159-A e § único).

Previsões sobre a insolvência transnacional (arts 167-A a 167-Y): A legislação falimentar reformada trata da insolvência transnacional, visando proporcionar mecanismos efetivos para a cooperação entre juízes e outras autoridades competentes do Brasil e de outros países em casos de insolvência transnacional;  o aumento da segurança jurídica para a atividade econômica e para o investimento; a administração justa e eficiente de processos de insolvência transnacional, de modo a proteger os interesses de todos os credores e dos demais interessados, inclusive do devedor; a proteção e a maximização do valor dos ativos do devedor;  a promoção da recuperação de empresas em crise econômico-financeira, com a proteção de investimentos e a preservação de empregos; e a promoção da liquidação dos ativos da empresa em crise econômico-financeira, com a preservação e a otimização da utilização produtiva dos bens, dos ativos e dos recursos produtivos da empresa, inclusive os intangíveis (art. 167-A I a III). Devem-se considerar o objetivo de cooperação internacional, a necessidade de uniformidade de sua aplicação e a observância da boa-fé (art. 167 § 1º). Ademais, destaca-se que o juiz somente poderá deixar de aplicar as regras da legislação falimentar se, no caso concreto, configurar-se manifesta ofensa à ordem pública; o Ministério Público intervirá nesses processos; a competência de aplicação dessas disposições é do Superior Tribunal de Justiça; e, em caso de conflito, as obrigações assumidas em tratados ou convenções internacionais em vigor no Brasil prevalecerão sobre as disposições da legislação falimentar (art. 167-A §§ 3º a 6º).


5. CONCLUSÃO

A Lei 14.112/20 promoveu mudanças na legislação falimentar e incluiu instrumentos processuais e materiais que favorecem o desenvolvimento dos institutos da recuperação judicial e extrajudicial e da falência da empresa. Nesse sentido, destacam-se as principais alterações e seus artigos respectivos, em relação aos institutos da recuperação judicial e extrajudicial e à falência.

Quanto aos institutos da recuperação judicial e da falência, as alterações estão relacionadas à prevenção do juízo (art. 6º §§ 8º e 9º); às suspensões e às proibições pelo período de 180 dias (art. 6º I a III); e à verificação e habilitação de créditos (arts. 10 §§ 7º a 10º; 16 e § 2º). Já, em relação à recuperação judicial, referem-se à: recuperação judicial de produtor rural (arts. 48 §§ 2º, 3º; 49 §§ 6º, 7º; 8º, 9º; 70-A) e grupo econômico (art. 69-G a 69-L); conciliação e mediação antecedente ou incidente ao processo de recuperação judicial (arts. 20-A a 20-D); instituição da constatação prévia no instituto da recuperação judicial (art. 51-A §§ 1º a 7º); impossibilidade de distribuição de lucros e dividendos aos sócios, sob pena de crime (art. 6º-A); possibilidade de prorrogação do stay period na recuperação judicial (art. 6º §§ 4º e 4º-A); substituição de assembleia geral por termo de adesão ou votação eletrônica e voto abusivo (art. 39 § 4º I a III, §§ 5º e 6º); inclusão de outros meios de recuperação judicial (art. 50, XVII e XVIII); documentos da petição inicial de recuperação judicial (art. 51, e, III, IX, X, XI); dispensa de apresentação da Certidão Negativa de Débitos pelo devedor em recuperação judicial (art. 52, II); plano de recuperação judicial alternativo pelos credores (art. 56, § 4º); pagamento dos créditos trabalhistas vencidos até a data do pedido de recuperação judicial (art. 54 § 2º, I a III); créditos tributários e débitos fiscais (art. 6º § 7º-B); autorização judicial para alienação ou oneração de bens ou direitos do ativo não circulante do devedor em recuperação judicial (arts. 66 §§ 1º a 4º; 66-A; 67 e § único); financiamento do devedor e do grupo econômico devedor durante a recuperação judicial – DIP Financing (arts. 69-A a 69-F); e as mudanças quanto à recuperação extrajudicial (arts. 161 § 1º; 163 § 7º e 8º e 164). Em relação ao instituto da falência, as alterações dizem respeito à: detalhamento dos objetivos e conceito da falência (art. 75, I a III e §§ 1º e 2º); desconsideração da personalidade jurídica na falência (art. 82-A e § único); créditos concursais (arts. 83 I a IX; e 84 I a V) e extraconcursais na falência (art. 84 I a V); realização do ativo na falência (arts. 142 a 145); encerramento e extinção das obrigações do falido (arts. 156 a 159-A e § único); e insolvência transnacional (arts 167-A a 167-Y), dentre outras.

Desse modo, verifica-se que a legislação falimentar reformada apresenta melhores condições de acesso ao instituto de recuperação judicial, de modo a promover a superação da crise econômico-financeira e assegurar a preservação e a função social da empresa e o estímulo ao exercício da atividade econômica. Outrossim, as alterações promovidas pela Lei nº 14.112/20 permitem a celeridade do processo de falência, o que possibilita a realocação eficiente de recursos na economia e o fomento ao empreendedorismo através do retorno rápido do falido ao mercado.


 REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 14.112, de 24 de dezembro de 2020. Altera as leis nºs 11.101/2005; 10.522/2002; 8.929/1994, para atualizar a legislação referente à recuperação judicial, à extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em: L14112 (planalto.gov.br). Acesso em: 01 Mai. 2021.

BRASIL. Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Distrito Federal, Presidência da República, 2005. Disponível em: Lei nº 11.101 (planalto.gov.br). Acesso em: 01 Mai. 2021.

BRASIL. Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002. Dispõe sobre o Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais e dá outras providências. Disponível em: L10522 (planalto.gov.br). Acesso em: 01 Mai. 2021.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DAMIAN, Terezinha. Alterações da legislação falimentar à luz da Lei nº 14.112/20. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6529, 17 maio 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/90403. Acesso em: 11 maio 2024.