SEGURO DE REPRESENTAÇÕES E GARANTIAS NOS CONTRATOS DE M&A

30/10/2018 às 14:22
Leia nesta página:

Operações de M&A são, por natureza, de altíssimo risco. É por meio das "representações e garantias" que o vendedor apresenta uma série de declarações sobre seu negócio. Entretanto, muitas delas podem não ser verdadeiras. Como o comprador pode se proteger?

Operações de fusões e aquisições (M&A) são, por natureza, operações de altíssimo risco.

Por mais técnica e cuidadosa que seja a due diligence, o comprador nunca estará livre do risco de que alguma informação prestada pelo vendedor seja falsa (ou não totalmente verdadeira).

É por meio das “representações e garantias” (representations and warranties) que o vendedor apresenta ao comprador uma série de declarações sobre o negócio (objeto da operação), como por exemplo a existência de demandas judiciais ou extrajudiciais passadas ou presentes, a existência de passivo, a regularidade dos livros contábeis, dentre outras, assegurando a veracidade das informações prestadas.

Por outro lado, é com base nas representações e garantias que o comprador busca entender melhor o funcionamento do negócio como um todo e, principalmente, entender seus riscos e contingências.

Mas e se as representações e garantias não forem verdadeiras?

Algumas declarações, se falsas, garantem ao comprador o direito de desistir do deal (“walk-away”); outras, permitem renegociações de preço, termos e cláusulas.

Por esses motivos, essa é uma das cláusulas mais importantes de um contrato de M&A e um dos pontos mais sensíveis de uma negociação. Consequentemente, é também responsável por um grande número de deals que mesmo em estágio avançado acabam não sendo consumados.

Uma solução relativamente nova e cada vez mais explorada em operações de M&A é a contratação de seguro para as representações e garantias.

O seguro de representações e garantias surgiu em Londres na década de 90 e começou a ser difundido na Europa nos anos 2000, mas só recentemente começou a ser usado de forma mais recorrente e efetiva nos Estados Unidos e Ásia.

A grande vantagem do seguro é confortar as partes com relação a potenciais riscos e contingências sobre os quais comprador e vendedor tenham entendimentos muito divergentes.

Por exemplo, em uma negociação hipotética, um comprador negocia a aquisição de uma empresa por $150 milhões e o vendedor insiste em fixar o teto de indenização em $10 milhões.

No entanto, após a realização da due diligence, o comprador chega à conclusão de que precisará de proteção de $30 milhões e que os $10 milhões sugeridos pelo vendedor não serão suficientes para protegê-lo de potenciais contingências.

A divergência das partes é de $20 milhões em uma transação de $150 milhões, ou seja, é extremamente improvável que as partes superem essa divergência e o deal dificilmente resistirá.

É em situações como essa que a contratação de um seguro para as representações e garantias pode “salvar” o negócio.

O valor do prêmio de seguros contra quebra das representações e garantias varia normalmente de 2% a 3% do valor segurado. Significa que no exemplo, o gap de $20 milhões que separa a expectativa das partes seria coberto a um custo de $400 a $600 mil.

Ao invés de cada uma das partes aumentar o risco esperado em $10 milhões (supondo que elas concordassem em dividir o custo do gap, o que é muito improvável), cada uma arcaria com o valor de $200 a $300 mil.

A divergência sobre valores é só uma das questões que podem travar as negociações.

É possível que as partes discordem também da duração de uma garantia, por exemplo. Enquanto para o vendedor pode ser extremamente desconfortável continuar responsável por potenciais contingências por um período maior de 12 meses, o comprador de um negócio nos Estados Unidos entende ideal que a garantia se estenda por pelo menos 24 meses, chegando a 6 anos com relação a contingências tributárias.

Além disso, a contratação de seguro traz para a relação contratual um terceiro que poderá responder por quebras contratuais no lugar de uma das partes. Em uma eventual situação de quebra nas representações e garantias, o comprador tem a opção de demandar judicialmente a seguradora e não o vendedor.

Pode parecer irrelevante, mas na prática existem muitas situações em que o comprador se vê de mãos atadas quando precisa discutir judicialmente termos contratuais que responsabilizariam o vendedor.

Pode ser que o vendedor seja um parceiro estratégico e que o ajuizamento de uma demanda judicial prejudique um relacionamento extremamente valioso e lucrativo. Ou então que o garantidor no contrato de M&A seja um executivo da empresa que tenha permanecido na condução da administração do negócio adquirido, de forma que demandá-lo judicialmente seja inviável para o comprador lesado.

É claro que a contratação de seguro não se resume a proteger o comprador ou oferecer um conforto ao vendedor que não terá de desembolsar grande parte do preço do negócio pra cobrir eventuais contingências. Também não é uma panaceia a remediar todas as adversidades de uma operação e blindar as partes contra todo e qualquer risco.

A conveniência e possibilidade da contratação do seguro devem ser analisadas caso e caso, de acordo com a real expectativa das partes e a necessidade concreta de alocação de riscos potenciais.

Independentemente disso, é uma excelente ferramenta que não deve ser poupada quando necessária a viabilizar o fechamento de uma operação, aproximando partes com expectativas muito divergentes especialmente com relação aos riscos do negócio.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Fonte: Eric Marcks and John A. Fisher. Effective Use of Representations and Warranties Insurance Policies in M&A Transactions. California Business Law Practitioner, Volume 28, Number 2, 2013.

Sobre a autora
Vitoria Schimiti Voltarelli

Advogada no Marques Filho Advogados Associados<br>

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo originalmente publicado em http://marquesfilhoadvogados.com.br/representacoes-e-garantias-ma/

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos