O novo CPC visto por um advogado: parte 4

22/04/2015 às 10:11
Leia nesta página:

A justiça que tarda é um simulacro de Justiça. A pressa estatal na distribuição da Justiça a transforma em vingança e transfere para os cidadãos a incapacidade do Estado de cumprir sua missão.

A justiça que tarda é um simulacro de Justiça. Digo isto com a experiência. Já trabalhei em vários casos que demoraram mais de uma década para serem solucionados e em um, com dezenas de autores, que demorou 20 anos e meio para ser liquidado. Neste, 3 dos meus clientes morreram no curso do processo e apenas seus herdeiros se beneficiaram com o resultado da demanda.

Sou, por princípio, um defensor da rapidez processual. Mas nem por isto gostei do novo CPC. Creio que uma justiça apressada é pouco mais que uma vingança pública que transfere para os cidadãos a incapacidade do próprio Estado de cumprir sua obrigação de distribuir Justiça. A natureza vingativa do novo CPC é evidenciada pela multas prescritas no cumprimento da sentença e na execução de título extra-judicial.

A parte que não cumpre voluntariamente a sentença pagará 10% de multa e 10% de honorários advocatícios (art. 523, §1º). As Fazendas Públicas, maiores cliente do Judiciário em razão da União, Estados, Municípios e suas autarquias e empresas públicas estarem acostumadas a lesar cidadãos, não estão sujeitas a pena semelhante mesmo que venham a descumprir sua obrigação de pagar o precatório de pequeno valor no prazo de 2 meses (art.  535 §3º, II). Contudo, a pena do art. 523, §1º beneficiará as Fazendas Públicas nas execuções fiscais. A obrigação de fazer ou na fazer está sujeita a multa independentemente do requerimento da parte (art. 537). O inadimplemento dos alimentos  fixados pela sentença acarretam o protesto do título (art. 528 §1º), podendo ainda acarretar a prisão do devedor caso justificativa não seja aceita (art. 528 §3º).

A ação monitória proposta indevidamente acarreta pena de multa de 10% (art. 702 §10º). Aquele que embargar a monitória de má fé também será punido de maneira semelhante (art. 702 §11º). A execução de título extra judicial pode acarretar a punição do executado em 20% do valor da dívida (art. 774, parágrafo único). O exequente ser condenado a indenizar o executado quando a sentença declarar inexistente, no todo ou em parte, a obrigação que ensejou a execução (art.  776). Quando a obrigação for de entregar coisa certa o Juiz poderá fixar multa diária sujeita a alteração (art. 806, §1º). O mesmo também pode ocorrer quando a obrigação for de não fazer, caso em que a multa contratual poderá ser reduzida (art. 814 e parágrafo único). O inadimplemento judicial da obrigação de fazer ou de não fazer pode acarretar despesas para o devedor ou sua condenação em pernas e danos (art. 816 e 823).

As multas, indenizações e honorários punitivos podem ser impostos pelo Juiz durante o cumprimento da sentença, execução do título extra judicial e trâmite da ação monitória. A parte contra quem foi constituído o título judicial ou que teve seus Embargos à Execução, Embargos de Terceiro ou Embargos à Ação Monitória rejeitados tem direito a Ação Rescisória no prazo de 2 anos (art. 966 e 975), a qual não impede a cobrança das multas exceto se for concedida tutela antecipada (art. 969).  No caso de a Ação Rescisória desconstituir a sentença, anular o título extra judicial em que se baseia a Execução e considerar inválido o documento que justificou a Ação  Monitória é evidente que todas as multas, indenizações e honorários punitivos serão indevidos.

Suponha agora que as multas, indenizações e honorários punitivos já tenham sido pagos quando da rescisão da sentença. Neste caso o vitorioso autor da rescisória será obrigado a cobrar aquilo que foi apressadamente obrigado a desembolsar pelo Juiz de primeira instância. A justiça que foi rápida para prejudicar o devedor/autor da rescisória será lenta para compensá-lo mesmo quando ele estiver certo. Portanto, falta ao novo CPC o necessário equilíbrio.

Os honorários do advogado foram disciplinados no art. 85 do novo CPC. Eles serão fixados entre 10% e 20% do valor da condenação dependendo do zelo profissional, do lugar da prestação de serviço, da complexidade da causa e do trabalho realizado (85 §2º), exceto naqueles casos em que foram definidas regras específicas para a fixação da remuneração dos procuradores das Fazendas Públicas. Contudo, os honorários advocatícios serão obrigatoriamente de 10% nos casos de inadimplemento da sentença condenatória de pagar quantia certa (art. 523 §1º), são reduzidos a 5% na ação monitória (art. 701) e pode ser elevado a 20%  quando rejeitados os embargos à execução(art. 827, §2º).

Não me agrada a distinção dos prazos concedidos ao credor e ao devedor. O devedor tem prazo de 15 dias para impugnar o cumprimento da sentença (art. 525). Se o réu se antecipar e cumprir a sentença pelo valor que entende correto, o credor terá apenas 5 dias para impugnar os cálculos ofertados pelo devedor (art. 526). É evidente que as grandes empresas (Bancos e montadoras, por exemplo) se beneficiarão desta regra, transferindo para os credores o encargo de correr atrás do prejuízo. Como a maioria dos advogados não faz cálculos complexos, os contadores que os assessoram não terão o mesmo prazo concedido aos que prestam serviços às grandes corporações (especialmente se as sentenças continuarem demorando a ser publicadas).

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Também não me agrada a distinção entre o cumprimento da sentença e a execução de título extra judicial. No primeiro caso todos os incidentes serão resolvidos nos próprios autos (art. 525); no outro o devedor e o terceiro deverão ajuizar Embargos de Terceiro (art. 674) e Embargos à Execução (art. 914). Contudo, o art. 525 §1º II, permite ao executado alegar sua ilegitimidade para cumprir a sentença nos próprios autos. Portanto, em tese o terceiro poderia ou não alegar sua ilegitimidade nos próprios autos. Suponha que ele faça isto.

Neste caso poderia o Juiz não resolver esta questão e prosseguir na execução contra o terceiro caso não seja interposto os Embargos de Terceiro? Penso que a resposta é não, pois o art. 518 obriga o Juiz a resolver todas as questões relativas à validade do procedimento de cumprimento da sentença. A legitimidade de parte é indispensável à validade deste. Além disto, o art. 330 II permite ao Juiz indeferir a inicial quando o réu for manifestamente ilegítimo. O exercício deste poder no início da Execução ou depois dele não é incompatível com o que consta do art. 798, do novo CPC.  

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

Advogado em Osasco (SP)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos