Não se cale! Agosto Lilás: sistema judiciário deve ser acessível e acolhedor para as vítimas de violência doméstica e de gênero

01/08/2023 às 11:48
Leia nesta página:

No Brasil, por hora, 26 mulheres sofrem agressão física. Uma menina ou mulher é estuprada a cada 10 minutos. Por dia, três mulheres são vítimas de feminicídio. A cada dois dias, uma travesti ou mulher trans é assassinada. Essas informações são da plataforma “Violência contra as Mulheres em Dados”, que reúne pesquisas, fontes e sínteses recentes sobre o problema no Brasil.

Ainda, quase 30% das brasileiras sofreram no ano de 2022 alguma violência ou agressão, de acordo com a pesquisa “Visível e invisível: a vitimização de mulheres no Brasil”, realizada pelo DataFolha e Fórum Brasileiro de Segurança Pública, sendo este o maior percentual de mulheres vítimas de diferentes formas de violência doméstica no Brasil, como espancamento ou tentativa de estrangulamento, ameaça com faca ou arma de fogo, ofensa sexual, entre outras. O levantamento foi feito com 1.042 mulheres com 16 anos ou mais de 126 municípios de pequeno, médio e grande porte.

Esses dados só corroboram com a real necessidade da promoção de debates e outras ações de políticas públicas de atenção integral à mulher em situação de violência.

Este mês “celebra-se” a campanha Agosto Lilás, concebida por meio da Lei n. 14.448/ 22, que estabelece que durante o mês de agosto a União, os estados e os municípios deverão promover ações de conscientização e esclarecimento sobre as diferentes formas de violência contra a mulher. Entre as ações está a iluminação de prédios públicos com luz de cor lilás, visando “orientar e difundir as medidas que podem ser adotadas judicial e administrativamente para combater a violência contra a mulher, bem como informar sobre órgãos e entidades envolvidos, redes de suporte disponíveis e canais de comunicação existentes”. A lei ainda determina que os entes federados poderão apoiar, ainda que tecnicamente, as atividades organizadas pela sociedade com o intuito de prevenir, combater e enfrentar os diferentes tipos de violência contra a mulher.

O Agosto Lilás se alinha com o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, lançado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mais um instrumento para que seja alcançada a igualdade de gênero, Objetivo de Desenvolvimento Sustentável – ODS 5 da Agenda 2030 da ONU, à qual o Supremo Tribunal Federal (STF) e o CNJ se comprometeram cumprir.

Importante salientar que o protocolo traz importantes exposições teóricas sobre o mote da igualdade, sendo um verdadeiro guia para que os julgamentos que ocorrem nos diferentes âmbitos da Justiça possam ser aqueles que realizem o direito à igualdade e à não discriminação de todas as pessoas, de modo que o exercício da função jurisdicional se dê de forma a concretizar um papel de não repetição de estereótipos, de não perpetuação de diferenças, constituindo-se um espaço de rompimento com culturas de discriminação e de preconceitos.

A violência contra a mulher é uma das mais graves violações dos direitos humanos no mundo atual. Infelizmente, ela persiste em todas as sociedades, independentemente do nível de desenvolvimento ou cultura. Para enfrentar esse problema complexo, é essencial que a Justiça, os magistrados e os advogados desempenhem um papel crucial na conscientização e na luta por igualdade de gênero.

A conscientização é o primeiro passo para a mudança significativa. É imperativo que todos os profissionais do sistema de Justiça compreendam plenamente a natureza e a gravidade da violência contra a mulher, bem como a desigualdade de gênero enraizada em nossa sociedade. Isso significa reconhecer que a violência contra a mulher não é apenas física, mas também psicológica, sexual, econômica, patrimonial e processual. Os magistrados, advogados e futuros operadores do Direito devem estar cientes de como essas formas de violência se manifestam e impactam a vida das mulheres.

Além do mais, é fundamental entender as causas profundas dessa violência, como a perpetuação de estereótipos de gênero, a cultura do machismo e a desigualdade econômica e social. Somente por meio da educação e da sensibilização para essas questões, a Justiça pode se tornar um instrumento eficaz no combate à violência contra a mulher.

Acredito que um dos maiores desafios enfrentados na promoção da igualdade de gênero é a necessidade de uma mudança de paradigma cultural. É papel dos magistrados, advogados e demais operadores do Direito romperem com padrões patriarcais e machistas, garantindo que suas decisões e atitudes não perpetuem preconceitos ou desigualdades de gênero. É essencial que eles sejam sensíveis e empáticos às experiências das mulheres que buscam ajuda e justiça.

O nosso sistema judiciário deve ser acessível e acolhedor para as vítimas de violência doméstica e de gênero. É preciso criar um ambiente seguro, livre de julgamento e estigma, onde as mulheres possam se sentir seguras para denunciar a violência que sofreram. Além disso, é crucial que as vítimas sejam ouvidas com respeito e que suas vozes sejam valorizadas durante todo o processo judicial.

Nesse sentindo, a capacitação contínua dos profissionais do sistema de Justiça é fundamental para garantir a eficácia no combate à violência contra a mulher. Isso inclui formação sobre a legislação existente, os mecanismos de proteção disponíveis e a sensibilização para a violência de gênero. Investir na formação dos magistrados e operadores do Direito é investir em uma Justiça mais justa e igualitária.

Outro ponto crucial é a necessidade de fortalecer a cooperação entre os diferentes atores do sistema de Justiça, incluindo juízes, promotores, defensores públicos e advogados. Uma abordagem multidisciplinar e integrada é essencial para enfrentar a violência contra a mulher de forma eficaz e abrangente. A cooperação entre esses profissionais deve ser pautada no respeito mútuo e na compreensão das especificidades de cada área de atuação.

A conscientização no ambiente judicial sobre a violência contra a mulher e a igualdade de gênero é essencial para o progresso de uma sociedade mais justa e igualitária. O papel desses profissionais é fundamental na proteção dos direitos das mulheres e na construção de um futuro em que a violência de gênero seja erradicada e a igualdade seja uma realidade para todos.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos