Desafios e Riscos Futuros da Regulamentação das Criptomoedas em meio à Era da Inteligência Artificial e Computação Quântica

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21/07/2023 às 18:57
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1.     Introdução

As criptomoedas, moedas digitais que utilizam criptografia para garantir transações seguras e controlar a criação de novas unidades, têm experimentado um crescimento e popularidade sem precedentes. Desde a criação do Bitcoin em 2009, o universo dos ativos digitais expandiu-se para incluir milhares de criptomoedas diferentes, cada uma com suas próprias características e utilidades. No entanto, com o crescimento e a popularidade das criptomoedas, surge a necessidade de regulamentação para garantir a estabilidade e segurança do mercado financeiro.

Neste contexto, é preciso analisar a regulamentação das criptomoedas e como a inteligência artificial e a computação quântica podem impactar esse universo em constante evolução. A regulamentação é uma questão fundamental para garantir a proteção dos investidores, prevenir atividades ilegais como lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, e promover a transparência e confiança no mercado de ativos digitais.

Além disso, a crescente interseção entre tecnologias emergentes, como a inteligência artificial e a computação quântica, com o mercado das criptomoedas apresenta novos desafios e oportunidades. Por um ponto de vista positivo, a inteligência artificial pode ser utilizada para analisar grandes volumes de dados e identificar padrões, auxiliando na detecção de fraudes e na previsão de tendências do mercado. Porém, em um cenário pessimista, a computação quântica pode representar uma ameaça à segurança das criptomoedas baseadas em criptografia convencional, exigindo a adoção de novos protocolos de segurança.

Logo, é necessário compreender como a regulamentação pode proporcionar um ambiente mais seguro e estável para o mercado de criptomoedas, ao mesmo tempo em que avaliará o impacto das tecnologias emergentes na evolução desse universo. Ao fim, espera-se fornecer uma avaliação relevante a fim de promover um debate informado sobre o futuro das criptomoedas e sua interação com as inovações tecnológicas em curso.

 

2.     Definição de criptomoedas

As criptomoedas são moedas digitais que utilizam a tecnologia de criptografia para garantir a segurança das transações e controlar a criação de novas unidades. Diferente das moedas tradicionais emitidas por governos, as criptomoedas são descentralizadas e operam em uma rede de computadores distribuídos conhecida como blockchain. Seguindo esse raciocínio, cada transação de criptomoeda é registrada em um bloco de dados e adicionada a uma cadeia de blocos, formando um registro público e imutável de todas as transações realizadas[1].

Através da criptografia, as criptomoedas garantem a autenticidade e integridade das transações, evitando a possibilidade de falsificação ou duplicação. Além disso, a descentralização das criptomoedas significa que não há uma autoridade central ou intermediária controlando as transações, tornando-as independentes de instituições financeiras ou governamentais. Se tratando da sua usabilidade, as criptomoedas podem ser mineradas, compradas em corretoras de criptomoedas ou recompensadas por trabalho realizado em um blockchain [2].

 

3.     Crescimento e popularidade das criptomoedas

As criptomoedas têm apresentado um crescimento impressionante ao longo dos anos, e seu valor de mercado tem chamado a atenção de investidores e traders em todo o mundo. A maior razão para isso é a volatilidade desses ativos digitais, que tem sido uma característica diferenciada, o que pode representar tanto uma oportunidade de lucro como um risco significativo para os investidores. A popularidade das criptomoedas também tem sido impulsionada por sua natureza global e pela facilidade de acesso a esses ativos através das plataformas de negociação online. Além disso, a crescente conscientização sobre a importância da diversificação de investimentos levou muitos a considerarem as criptomoedas como uma classe de ativos a ser incluída em suas carteiras de investimento.

As criptomoedas operam em uma rede descentralizada de computadores, conhecida como blockchain, diferenciando-as das moedas tradicionais emitidas por governos. Essa descentralização significa que não há uma autoridade central ou intermediária controlando as transações ou emitindo novas unidades de criptomoeda[3]. Em vez disso, as transações são verificadas e registradas pelos próprios participantes da rede, tornando o sistema resistente a falhas e fraudes.

Porém, embora as transações em blockchain sejam públicas e registradas, as identidades dos usuários envolvidos nas transações podem permanecer anônimas[4]. O motivo é o fato de que os endereços de carteiras de criptomoeda são compostos por sequências de caracteres aleatórios, tornando difícil rastrear as transações de volta a indivíduos específicos. Logo, as criptomoedas oferecem acesso financeiro inclusivo, permitindo que pessoas sem acesso a serviços bancários tradicionais participem do sistema financeiro. A praticabilidade e tanta, que tudo o que é necessário para usar criptomoedas é um dispositivo conectado à internet e uma carteira digital, tornando-as uma opção viável para pessoas em áreas rurais ou com poucos recursos financeiros.

Muitas criptomoedas têm um limite de fornecimento máximo, criando um elemento de escassez que pode afetar a oferta e a demanda das criptomoedas, potencialmente influenciando seus valores no mercado[5]. Ademais, todas as transações em uma blockchain são registradas de forma pública e imutável. Isso significa que uma vez que uma transação é registrada, ela não pode ser alterada ou apagada, garantindo confiabilidade ao investidor que pode checar todas as atividades da transação.

Essas características tornam as criptomoedas uma classe de ativos financeiros única e inovadora, com o potencial de impactar significativamente o futuro das finanças e economia global. No entanto, a volatilidade e a natureza em evolução do mercado de criptomoedas também apresentam desafios e riscos, exigindo que os investidores compreendam plenamente as características desses ativos antes de decidirem investir.

 

4.     Importância da regulamentação das criptomoedas

A necessidade da regulamentação das criptomoedas é evidente à medida que esses ativos digitais se tornam cada vez mais populares. A regulamentação pode proporcionar maior segurança para os investidores, prevenir atividades ilegais, como a lavagem de dinheiro, e contribuir para a estabilidade financeira. Desse modo, à medida que as criptomoedas ganham cada vez mais popularidade, torna-se evidente a importância da regulamentação para esse mercado em expansão. Esses ativos digitais revolucionaram a forma como realizamos transações financeiras, oferecendo uma alternativa descentralizada e segura aos sistemas tradicionais. No entanto, com o crescimento rápido desse universo financeiro digital, surgem desafios que precisam ser abordados para garantir a sua integridade e eficiência.

A regulamentação das criptomoedas desempenha um papel crucial na proteção dos investidores e na manutenção da confiança dos usuários nesse novo ecossistema financeiro[6]. Ao estabelecer diretrizes claras e regras transparentes, os órgãos reguladores podem mitigar os riscos associados ao investimento em criptoativos, reduzindo a probabilidade de fraudes e esquemas ilegais que possam prejudicar os participantes do mercado.

Um dos principais desafios enfrentados pelas criptomoedas é a sua associação com atividades ilícitas, como a lavagem de dinheiro e a evasão fiscal. Ao definir um quadro legal para os negócios relacionados a criptomoedas, é possível que as autoridades monitorem as transações e identifiquem comportamentos suspeitos, tornando mais difícil o uso indevido das criptomoedas para fins ilegais[7]. Desse modo, a regulamentação contribui para a integridade do sistema financeiro como um todo, evitando que as criptomoedas sejam exploradas por criminosos.

Contudo, é importante encontrar um equilíbrio adequado na regulamentação das criptomoedas. Um excesso de regulamentação pode sufocar a inovação e a criatividade no setor, inibindo o potencial desses ativos digitais de impulsionar o desenvolvimento econômico e tecnológico. Por isso, é fundamental que as políticas regulatórias sejam elaboradas com base em uma compreensão aprofundada das peculiaridades desse mercado em constante evolução.

 

5.     Panorama atual da regulamentação das criptomoedas atualmente

No Brasil, a regulamentação das criptomoedas está ganhando forma com a Lei Nº 14.478, sancionada em 21 de dezembro de 2022. Essa lei estabelece diretrizes para a prestação de serviços de ativos virtuais e a regulamentação das empresas que prestam esses serviços. Ela também altera o Código Penal para prever o crime de fraude com a utilização de ativos virtuais, valores mobiliários ou ativos financeiros. De acordo com a norma, as empresas que prestam serviços de ativos virtuais só podem operar no Brasil com autorização prévia de um órgão ou entidade da Administração Pública federal[8].

A lei também estabelece que a prestação de serviços de ativos virtuais deve seguir diretrizes como livre iniciativa e livre concorrência, boas práticas de governança, segurança da informação, proteção de dados pessoais, proteção e defesa de consumidores e usuários, proteção à poupança popular, solidez e eficiência das operações, e prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo. Além disso, a lei define o que são ativos virtuais, no artigo 3º, onde são consideradas representações digitais de valor que podem ser negociadas ou transferidas por meios eletrônicos e utilizadas para pagamentos ou investimentos[9].

Na União Europeia, a regulamentação das criptomoedas está sendo moldada pela Regulação de Mercados em Criptoativos (MiCAR), que foi ratificada pelo Parlamento Europeu em outubro de 2022. A MiCAR é o primeiro arcabouço regulatório para criptoativos no mundo e cobre emissores e provedores de serviços, com o objetivo de proteger consumidores e investidores, garantir a estabilidade financeira e apoiar a inovação. A regulamentação entrará em vigor entre meados de 2024 e início de 2025, posicionando a Europa como uma região atrativa no mercado de criptoativos[10].

A referida regulação define um criptoativo como "uma representação digital de valor ou direitos que podem ser transferidos e armazenados eletronicamente, usando tecnologia de registro distribuído ou tecnologia similar". A Regulação distingue 'criptomoedas' de 'tokens'. A MiCAR também estabelece requisitos para emissores de criptoativos e provedores de serviços de criptoativos (CASPs). Assim sendo, emissores de criptoativos devem fornecer informações completas e transparentes sobre os criptoativos que emitem, e cumprir com regras de divulgação e transparência. De maneira semelhante, provedores de serviços de criptoativos devem ser registrados e implementar medidas de segurança e conformidade com a prevenção à lavagem de dinheiro[11].

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6.     Impacto da inteligência artificial nas criptomoedas

A inteligência artificial é uma tecnologia que permite que computadores e sistemas de computação "aprendam" a realizar tarefas sem serem explicitamente programados para isso. Partindo dessa premissa, em vez de seguir instruções específicas, a inteligência artificial utiliza algoritmos avançados e técnicas de aprendizado para analisar dados, reconhecer padrões e tomar decisões com base nas informações que recebe[12]. É como se o computador estivesse imitando a capacidade de aprendizado e raciocínio humano, mas de uma maneira mais rápida e eficiente.

No que cerne o mercado de criptomoedas, a inteligência artificial é empregada para analisar grandes volumes de dados em tempo real e identificar padrões de comportamento do mercado[13]. A análise de dados e as previsões de mercado baseadas em inteligência artificial no contexto das criptomoedas, embora promissoras, também apresentam riscos significativos que merecem atenção.

Enquanto essas tecnologias oferecem insights valiosos para os investidores, elas podem gerar distorções no mercado e aumentar a volatilidade dos preços das criptomoedas. Um dos principais riscos associados à análise de dados e previsões de mercado é a possibilidade de overfitting. Isso ocorre quando os algoritmos de inteligência artificial são ajustados excessivamente aos dados históricos do mercado, resultando em previsões altamente precisas para o passado, mas incapazes de generalizar corretamente para o futuro[14], podendo levar os investidores a tomarem decisões com base em informações distorcidas, levando a perdas significativas em suas operações no mercado de criptomoedas.

Além disso, a dependência excessiva de algoritmos de inteligência artificial para tomar decisões de investimento pode levar à automatização excessiva e à perda de controle humano. Os investidores podem se tornar excessivamente confiantes nas previsões de mercado geradas pela inteligência artificial, negligenciando a análise cuidadosa dos fundamentos dos ativos digitais e outros fatores macroeconômicos que também influenciam o mercado. Isso pode criar um ambiente propício para bolhas especulativas e crises financeiras.

Outra questão crítica é a vulnerabilidade dos algoritmos de inteligência artificial a ataques maliciosos[15]. Hackers podem explorar vulnerabilidades nos algoritmos e manipular os dados usados para previsões, resultando em informações falsas e prejudiciais para os investidores. Esses ataques podem minar a confiança no mercado de criptomoedas e desencadear grandes oscilações nos preços dos ativos digitais.

 

7.     O potencial da computação quântica para as criptomoedas

A computação quântica é um campo da ciência da computação que utiliza os princípios da mecânica quântica, uma teoria fundamental da física que descreve o comportamento das partículas subatômicas, para realizar cálculos e processamentos de dados[16]. Ao contrário dos computadores clássicos, que utilizam bits para representar informações como 0s e 1s, os computadores quânticos usam qubits, que são partículas quânticas capazes de estar em múltiplos estados simultaneamente. Essa propriedade de superposição dos qubits permite que um computador quântico realize muitas operações em paralelo, tornando-o potencialmente muito mais poderoso do que um computador clássico para resolver certos tipos de problemas[17].

No entanto, mesmo que a computação quântica tenha sido celebrada como um avanço tecnológico promissor, seu potencial para o mundo das criptomoedas também traz consigo riscos significativos que não podem ser ignorados. Isso pois a computação quântica é uma tecnologia emergente que se baseia nas propriedades da mecânica quântica para realizar cálculos extremamente rápidos e complexos. Enquanto isso pode ser visto como uma vantagem em várias áreas, para o universo das criptomoedas, representa uma ameaça real à segurança e à integridade das transações e das carteiras digitais.

Um dos principais riscos da computação quântica para as criptomoedas é sua capacidade de quebrar os algoritmos de criptografia atualmente em uso[18]. Atualmente, a criptografia de chave pública, que é a base da segurança das transações de criptomoedas, é protegida por problemas matemáticos difíceis de serem resolvidos por computadores clássicos.

Todavia, a computação quântica tem o potencial de resolver esses problemas rapidamente através de um algoritmo chamado Shor's algorithm[19]. Isso significa que a computação quântica poderia descriptografar chaves privadas e quebrar a segurança das transações, permitindo acesso não autorizado aos fundos das carteiras. Pode também ser citado como outro exemplo de risco a ameaça à descentralização das criptomoedas, que é uma das principais características das criptomoedas, pois algumas delas operam em uma rede de computadores distribuídos e não são controladas por uma única entidade central.

Contudo, a computação quântica pode abrir caminho para o surgimento de supercomputadores controlados por uma única entidade ou governo, que poderiam dominar a rede e exercer controle sobre as transações. Isso iria contra o princípio fundamental da descentralização e colocaria em risco a segurança e a independência das criptomoedas.

Ademais, a computação quântica pode também comprometer a imutabilidade do blockchain, que é a base de dados público e distribuído que registra todas as transações de criptomoedas. Com sua capacidade de processamento exponencialmente maior, a computação quântica poderia alterar registros no blockchain[20], tornando possível reverter transações passadas ou criar transações falsas.

Isso minaria a confiança dos usuários nas criptomoedas e afetaria sua credibilidade como uma forma segura e confiável de transações financeiras. Diante desses riscos, é essencial que a comunidade das criptomoedas e os desenvolvedores de tecnologia busquem soluções para mitigar os efeitos da computação quântica. Uma opção é a adoção de algoritmos de criptografia pós-quânticos, que são resistentes à computação quântica. Outra abordagem é o uso de tecnologias de blockchain mais avançadas que reforcem a segurança e a resistência a ataques quânticos.

 

8.     Conclusão

Os desenvolvimentos nessa área destacam a importância de uma abordagem proativa na preparação para o advento da computação quântica. Os reguladores e as empresas do setor de criptomoedas devem trabalhar em conjunto para desenvolver soluções criptográficas resistentes à computação quântica e garantir que os ativos dos usuários estejam protegidos contra possíveis ameaças futuras. Diante dessas tendências, investidores e usuários de criptomoedas enfrentam desafios e oportunidades. Por um lado, a crescente regulamentação pode proporcionar maior segurança e confiança no mercado de criptomoedas, tornando-o mais atraente para investidores institucionais e de varejo. Por outro lado, a regulamentação excessivamente restritiva pode limitar a inovação e a liberdade de escolha dos usuários.

É fundamental que os investidores compreendam plenamente os riscos envolvidos ao investir em criptomoedas e adotem uma abordagem cautelosa e informada. Além disso, a educação e a conscientização sobre as criptomoedas e as tecnologias associadas são essenciais para permitir que os usuários tomem decisões bem fundamentadas. Em conclusão, o futuro da regulamentação das criptomoedas será moldado por avanços tecnológicos, como a inteligência artificial e a computação quântica, bem como por considerações de segurança, proteção ao investidor e inovação. A busca por uma regulamentação equilibrada e adaptável será fundamental para garantir que as criptomoedas continuem a desempenhar um papel significativo no cenário financeiro global, oferecendo benefícios e oportunidades para investidores e usuários em todo o mundo.


REFERÊNCIAS

Sobre o autor
Pedro Vitor Serodio de Abreu

LL.M. em Direito Econômico Europeu, Comércio Exterior e Investimento pela Universität des Saarlandes. Legal Assistant na MarketVector Indexes.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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