Análise jurídica da lei nº. 14.128 de 26 de março de 2021. Veja se você ou alguém próximo tem direito de receber indenização em razão da Covid-19.

27/11/2022 às 20:11
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Análise jurídica da lei nº. 14.128 de 26 de março de 2021. Veja se você ou alguém próximo tem direito de receber indenização em razão da Covid-19.

Vinícius Costa de Moraes¹

Segundo a Lei 14.128 de 26 de março de 2021 é possível sim a indenização em até 50 mil reais em casos de incapacidade permanente e 10 mil reais com acréscimos legais para cônjuges e herdeiros de profissionais e trabalhadores da saúde que vieram a óbito em razão do novo coronavírus. Esta lei e o julgamento dela em Ação Direta de inconstitucionalidade nº. 6070/DF, que julgou a constitucionalidade da norma e assim permite que a União seja obrigada a indenizar os familiares das vítimas da covid-19 é o tema deste presente artigo.

A lei define quem são os beneficiários e quais as possibilidades de se requerer a indenização. Logo no seu primeiro artigo, a norma relata que trata-se de uma compensação financeira a ser paga pela União aos profissionais e trabalhadores da saúde, que durante o período de emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus trabalharam diretamente no atendimento dos pacientes acometidos pela Covid-19, adquiriram sequelas permanentes, bem como para os familiares destes profissionais da saúde que vieram a óbito. É o que diz o seguinte art. 1º da lei 14.128:

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre compensação financeira a ser paga pela União aos profissionais e trabalhadores de saúde que, durante o período de emergência de saúde pública de importância nacional decorrente da disseminação do novo coronavírus (SARS-CoV-2), por terem trabalhado no atendimento direto a pacientes acometidos pela Covid-19, ou realizado visitas domiciliares em determinado período de tempo, no caso de agentes comunitários de saúde ou de combate a endemias, tornarem-se permanentemente incapacitados para o trabalho, ou ao seu cônjuge ou companheiro, aos seus dependentes e aos seus herdeiros necessários, em caso de óbito.

Parágrafo único. Para os fins desta Lei, considera-se:

I - profissional ou trabalhador de saúde:

a) aqueles cujas profissões, de nível superior, são reconhecidas pelo Conselho Nacional de Saúde, além de fisioterapeutas, nutricionistas, assistentes sociais e profissionais que trabalham com testagem nos laboratórios de análises clínicas;

b) aqueles cujas profissões, de nível técnico ou auxiliar, são vinculadas às áreas de saúde, incluindo os profissionais que trabalham com testagem nos laboratórios de análises clínicas;

c) os agentes comunitários de saúde e de combate a endemias;

d) aqueles que, mesmo não exercendo atividades-fim nas áreas de saúde, auxiliam ou prestam serviço de apoio presencialmente nos estabelecimentos de saúde para a consecução daquelas atividades, no desempenho de atribuições em serviços administrativos, de copa, de lavanderia, de limpeza, de segurança e de condução de ambulâncias, entre outros, além dos trabalhadores dos necrotérios e dos coveiros; e

e) aqueles cujas profissões, de nível superior, médio e fundamental, são reconhecidas pelo Conselho Nacional de Assistência Social, que atuam no Sistema Único de Assistência Social;

II - dependentes: aqueles assim definidos pelo art. 16 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991;

III - Espin-Covid-19: estado de emergência de saúde pública de importância nacional, declarado pela Portaria do Ministério da Saúde nº 188, de 3 de fevereiro de 2020, em decorrência da infecção humana pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), que se encerrará com a publicação de ato do Ministro de Estado da Saúde, na forma dos §§ 2º e 3º do caput do art. 1º da Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.

Nos artigos seguintes da lei de compensação financeira em razão da Covid-19, o texto normativo relata quais são os valores a serem pagos, bem como quem é o responsável pela análise da incapacidade permanente, a isenção do pagamento do imposto de renda em razão da natureza indenizatória da compensação. Quanto aos valores a serem pagos, o art. 3º diz o seguinte:

Art. 3º A compensação financeira de que trata esta Lei será composta de:

I 1 (uma) única prestação em valor fixo de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), devida ao profissional ou trabalhador de saúde incapacitado permanentemente para o trabalho ou, em caso de óbito deste, ao seu cônjuge ou companheiro, aos seus dependentes e aos seus herdeiros necessários, sujeita, nesta hipótese, a rateio entre os beneficiários;

II 1 (uma) única prestação de valor variável devida a cada um dos dependentes menores de 21 (vinte e um) anos, ou 24 (vinte e quatro) anos se cursando curso superior, do profissional ou trabalhador de saúde falecido, cujo valor será calculado mediante a multiplicação da quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pelo número de anos inteiros e incompletos que faltarem, para cada um deles, na data do óbito do profissional ou trabalhador de saúde, para atingir a idade de 21 (vinte e um) anos completos, ou 24 (vinte e quatro) anos se cursando curso superior.

§ 1º A prestação variável de que trata o inciso II do caput deste artigo será devida aos dependentes com deficiência do profissional ou trabalhador de saúde falecido, independentemente da idade, no valor resultante da multiplicação da quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pelo número mínimo de 5 (cinco) anos.

§ 2º No caso de óbito do profissional ou trabalhador de saúde, se houver mais de uma pessoa a ser beneficiada, a compensação financeira de que trata o inciso I do caput deste artigo será destinada, mediante o respectivo rateio em partes iguais, ao cônjuge ou companheiro e a cada um dos dependentes e herdeiros necessários.

§ 3º A integralidade da compensação financeira, considerada a soma das parcelas devidas, quando for o caso, será dividida, para o fim de pagamento, em 3 (três) parcelas mensais e sucessivas de igual valor.

§ 4º No caso de óbito do profissional ou trabalhador de saúde, será agregado o valor relativo às despesas de funeral à compensação financeira de que trata o inciso I do caput deste artigo, na forma disposta em regulamento.

A lei ainda deixa claro que o pagamento da compensação financeira não prejudicará o recebimento de benefícios previdenciários e assistenciais. Assim, nada impede o recebimento em conjunto com aposentadoria, auxílio doença, bem como o benefício do Auxílio-Brasil. Outra questão pertinente é que a lei é retroativa, de modo que é possível ter direito à indenização mesmo naqueles casos anteriores ao início da vigência da norma, ou seja, desde o dia 3 de fevereiro de 2020, através da portaria nº. 188, do Ministro de Estado da Saúde.

Na ADI 6970/DF com requerimento de medida cautelar, ajuizado pelo Presidente da República contra a referida lei em questão, o requerente alegou dentre outros motivos a contrariedade da al. c do inciso II do § 1º do art. 61 da Constituição Federal e às condicionantes constitucionais de responsabilidade fiscal para aprovação de programas de expansão de ações governamentais fixadas na Emenda nº. 109/2021. A relatora da ação foi a Excelentíssima Senhora Ministra Carmem Lúcia, que em brilhante voto rechaçou a tese do requerente, primeiro no que tange a violação do art. 61 da Constituição Federal, assim votou a ministra:

Na indicação legislativa dos profissionais que eventualmente possam se beneficiar do instituto, não há distinção quanto à natureza jurídica do serviço de saúde prestado, público ou privado, ou no tocante de atuação na área de saúde, se na esfera de atividades da União, Estados ou Distrito Federal ou Municípios. A lei não restringe os beneficiários da norma aos servidores públicos federais, conquanto também eles possam vir a titularizar aquele direito. O legislador não alterou o regime jurídico público federal do servidor. Legislou sobre matéria de política pública social, na norma se abrangendo todos os profissionais de saúde do setor público ou privado de todos os entes da Federação, que tenham desempenhado suas funções em atendimento direto a pacientes acometidos pela Covid-19 e, por isso, se tenham tornado incapazes permanentemente para o trabalho ou morrendo em decorrência deste desempenho. Também não se evidencia, na espécie, norma de criação ou extinção de órgão público federal a cuidar de matéria de organização da Administração Pública, o que poderia atrair o vício de inconstitucionalidade formal alegado...

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Quanto ao fato de violar às condicionantes constitucionais de responsabilidade fiscal para aprovação de programas de expansão de ações governamentais fixadas na Emenda nº. 109/2021, a relatora assim entendeu:

Na espécie se tem que o complexo normativo e jurisprudencial apresentado, a compensação financeira prevista na Lei n. 14.128/2021 destina-se, pois, ao enfrentamento das consequências sociais e econômicas havidas pela calamidade pública provocada pela Covid-19. Tem ela vigência e efeitos restritos em sua duração, tendo por beneficiários da compensação financeira os profissionais de saúde atuantes diretamente no combate à pandemia durante o período de estado de emergência em saúde pública nacional, prolongado, conforme este Supremo Tribunal assentou na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 6.625 e também conforme reconhecido pela Portaria n. 188/2020 do Ministro de Estado da Saúde, nos termos do Decreto n. 7.616/2011. A compensação financeira em exame cuida de indenização em razão de um evento específico, não configurando despesa obrigatória de caráter continuado. Dela se poderão beneficiar o profissional de saúde ou os seus herdeiros que comprovem que a infecção causada pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2) tenha ocorrido durante o Espin-Covid-19 (estado de emergência em saúde pública de importância nacional em decorrência da infecção humana pelo novo coronavírus), nos termos do § 4º do art. 2º da Lei n. 14.128/2021...O pagamento da compensação financeira instituída pela Lei em exame, restrita ao período de calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19, insere-se, portanto, no quadro normativo especificado nas Emendas Constitucionais ns. 106/2020 e 109/2021, pelas quais se excepcionaram a observância de condicionantes fiscais, como, por exemplo, o disposto no art. 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal: Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de: I estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes; II declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias. O disposto no inc. I do art. 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal foi reproduzido, com conteúdo análogo, no art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, incluído pela Emenda Constitucional n. 95/2016. Por ele se estabelece que a proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro.

Deste modo, o Supremo Tribunal Federal julgou por unanimidade improcedente o pedido do requerente, mantendo assim a constitucionalidade da Lei 14.128 de 26 de março de 2021. É bom salientar que o rol de profissionais e trabalhadores da saúde é bem extenso, e compreende todo aquele que auxiliou ou prestou serviço de apoio presencialmente nos estabelecimentos de saúde, como é o caso de agentes comunitários e seguranças e funcionários em áreas administrativas.

Uma questão interessante e que causa questionamento é o fato da lei não ter dito qual órgão competente para realizar o pedido administrativamente. Apesar da omissão legislativa, não se pode aceitar que a falta de regulamentação torne inviável a concessão dos benefícios indenizatórios. Para tanto a parte interessada, no caso o trabalhador ou profissional de saúde, ou no caso do cônjuge sobrevivente e os dependentes do profissional falecido em razão da Covid-19 devem ingressar com ação de concessão de compensação financeira em face da União Federal.

Em resumo, a Lei 14.128 de 26 de março de 2021 é um instrumento normativo de alto impacto social. É uma forma de amenizar a dor e o sofrimento daqueles que perderam seus parentes em razão da Covid-19 ou que ficaram incapazes permanentemente. Uma vitória legislativa de toda população em meio a maior crise sanitária que já abalou este país.

REFERÊNCIAS BIBLIGRÁFICAS

BRASIL. Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2021/lei-14128-26-marco-2021-

______. Supremo Tribunal Federal. ADI nº 6970/DF. Relator: Ministro Carmem Lúcia . Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15352988305&ext=.pdf. Acesso em: 16 nov. 2022.

Sobre o autor
Vinicius Costa de Moraes

Bacharel em Direito pelo Centro de Ensino Unificado de Teresina – CEUT. Bacharel em Segurança Pública pela Universidade Estadual do Piauí – UESPI. Especialização em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera – UNIDERP. Oficial formado pela Academia da Polícia Militar do Piauí. Ex-Diretor Administrativo adjunto do HPMPI. Atualmente Gerente de Recursos Humanos e coordenador do projeto HPM nos Bairros.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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