O que diz a legislação brasileira sobre criptomoedas?

25/10/2022 às 16:20
Leia nesta página:

CRIPTOMOEDAS SOB O PRISMA DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E A SUA REGULAMENTAÇÃO NO BRASIL

O mercado de Criptomoedas cresceu exponencialmente nos últimos anos, com menção especial ao ativo digital Bitcoin, principalmente netse período de pandemia / pós pandemia1.

Com efeito, esse mercado de Criptomoedas se tornou mais interessante aos investidores, ao passo que a globalização está em seu ápice, o que enseja a possibilidade da utilização de “moedas” não estatais, bem como, porque, no caso do Brasil por exemplo, com a pandemia, alguns dos investimentos “mais comuns” se tornaram menos rentáveis.

Dessa forma, com a valorização das Criptomoedas, o investimento nesse mercado aumentou bastante, e muitos investidores optaram por se aventurar nele.

Todavia, como fica a legislação brasileira das criptomoedas ?

É legal?

Inicialmente, cumpre esclarecer que o princípio da legalidade, estabelecido pelo artigo 5º, II, da Constituição Federal, prevê que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Em outras palavras, no Brasil, o Estado somente pode obrigar ou proibir certa conduta, caso haja previsão legal.

DETENÇÃO OU COMERCIALIZAÇÃO DE CRIPTOATIVOS

Portanto, sendo certo que no Brasil não existe nenhuma regulamentação acerca da detenção ou comercialização de criptoativos, seja regulamentando ou proibindo, pode-se dizer que a detenção e a comercialização dos criptoativos é legal.

OBRIGATORIEDADE DOS INVESTIDORES E EXCHANGES

Por outro lado, e em que pese não existir nenhuma regulamentação acerca da detenção ou comercialização de criptoativos, a Instrução Normativa n. 1.888 da Receita Federal2 dispõe acerca da necessidade dos investidores e exchanges informarem, à própria Receita Federal, movimentações de criptomoeda, quando a movimentação estiver enquadrada nos termos do artigo 6º da referida3.

E OS QUE NÃO SE ENQUADRAM COMO EXCHANGE?

Vale fazer menção especial ao caso das operações de investidores (pessoas físicas ou jurídicas) que não se enquadram como exchange4, cuja informação deve ser prestada sempre que o valor da operação ultrapassar R$30.000,00, desde que a operação envolva exchange domiciliada no exterior, ou, outras pessoas físicas ou jurídicas, que também não se enquadram como exchanges.

Existem diversas sanções no caso de descumprimento da Instrução Normativa n. 1.888 da Receita Federal, previstas em seus artigos 10e 115, e, portanto, é imprescindível que o investidor se atenha a essas normas.

Sendo assim, é certo que apesar de não haver nenhuma lei que preveja expressamente a legalidade da detenção / comercialização de criptoativos, o princípio da legalidade faz com que essa detenção / comercialização seja legal, porém, os investidores desse mercado devem se manter antenados com relação à outras formas de regulamentação, como por exemplo, a Instrução Normativa n. 1.888 da Receita Federal, pois existem sanções que podem ser aplicadas caso não haja observância.

1 – “Mercado de criptomoedas alcança novo status em 2021 e ganha outros desafios para 2022“, por Laelya Longo, da Valor Investe, em 17/01/2022

2 – INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 1888, DE 03 DE MAIO DE 2019 – Institui e disciplina a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações realizadas com criptoativos à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB)

3 – Art. 6º Fica obrigada à prestação das informações a que se refere o art. 1º:

I – a exchange de criptoativos domiciliada para fins tributários no Brasil;

II – a pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no Brasil quando:

a) as operações forem realizadas em exchange domiciliada no exterior; ou

b) as operações não forem realizadas em exchange.

§ 1º No caso previsto no inciso II do caput, as informações deverão ser prestadas sempre que o valor mensal das operações, isolado ou conjuntamente, ultrapassar R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

§ 2º A obrigatoriedade de prestar informações aplica-se à pessoa física ou jurídica que realizar quaisquer das operações com criptoativos relacionadas a seguir:

I – compra e venda;

II – permuta;

III – doação;

IV – transferência de criptoativo para a exchange;

V – retirada de criptoativo da exchange;

VI – cessão temporária (aluguel);

VII – dação em pagamento;

VIII – emissão; e

IX – outras operações que impliquem em transferência de criptoativos. (INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 1888, DE 03 DE MAIO DE 2019)

4 – Art. 5º Para fins do disposto nesta Instrução Normativa, considera-se:

I – criptoativo: a representação digital de valor denominada em sua própria unidade de conta, cujo preço pode ser expresso em moeda soberana local ou estrangeira, transacionado eletronicamente com a utilização de criptografia e de tecnologias de registros distribuídos, que pode ser utilizado como forma de investimento, instrumento de transferência de valores ou acesso a serviços, e que não constitui moeda de curso legal; e

II – exchange de criptoativo: a pessoa jurídica, ainda que não financeira, que oferece serviços referentes a operações realizadas com criptoativos, inclusive intermediação, negociação ou custódia, e que pode aceitar quaisquer meios de pagamento, inclusive outros criptoativos.

Parágrafo único. Incluem-se no conceito de intermediação de operações realizadas com criptoativos, a disponibilização de ambientes para a realização das operações de compra e venda de criptoativo realizadas entre os próprios usuários de seus serviços. (INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 1888, DE 03 DE MAIO DE 2019)

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

4 – Art. 10. A pessoa física ou jurídica que deixar de prestar as informações a que estiver obrigada, nos termos do art. 6º, ou que prestá-las fora dos prazos fixados no art. 8º, ou que omitir informações ou prestar informações inexatas, incompletas ou incorretas, ficará sujeita às seguintes multas, conforme o caso:

I – pela prestação extemporânea:

a) R$ 500,00 (quinhentos reais) por mês ou fração de mês, se o declarante for pessoa jurídica em início de atividade, imune ou isenta, optante pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional), instituído pela Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, ou que na última declaração apresentada tenha apurado o Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) com base no lucro presumido;

b) R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) por mês ou fração de mês, se o declarante for pessoa jurídica não incluída na alínea “a”; ou

c) R$ 100,00 (cem reais) por mês ou fração, se pessoa física;

II – pela prestação com informações inexatas, incompletas ou incorretas ou com omissão de informação:

a) 3% (três por cento) do valor da operação a que se refere a informação omitida, inexata, incorreta ou incompleta, não inferior a R$ 100,00 (cem reais), se o declarante for pessoa jurídica; ou

b) 1,5% (um inteiro e cinco décimos por cento) do valor da operação a que se refere a informação omitida, inexata, incorreta ou incompleta, se o declarante for pessoa física; e

III – pelo não cumprimento à intimação da RFB para cumprir obrigação acessória ou para prestar esclarecimentos nos prazos estipulados pela autoridade fiscal, o valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) por mês-calendário;

§ 1º A multa prevista na alínea “a” do inciso II do caput será reduzida em 70% (setenta por cento) se o declarante for pessoa jurídica optante pelo Simples Nacional.

§ 2º A multa prevista na alínea “b” do inciso I do caput será aplicada também, em caso de apresentação das informações fora do prazo previsto no art. 8º, à pessoa jurídica que na última declaração tenha utilizado mais de uma forma de apuração do lucro ou tenha realizado operação de reorganização societária.

§ 3º A multa prevista no inciso I do caput será reduzida à metade nos casos em que a obrigação acessória for cumprida antes de qualquer procedimento de ofício.

Art. 11. Sem prejuízo da aplicação da multa prevista no inciso II do caput do art. 10, poderá ser formalizada comunicação ao Ministério Público Federal, quando houver indícios da ocorrência dos crimes previstos no art. 1º da Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998. (INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 1888, DE 03 DE MAIO DE 2019)

Sobre o autor
Guilherme Molinari

Advogado do Battaglia & Pedrosa Advogados. Graduado em Direito pela FADI – Faculdade de Direito de Sorocaba. Pós-graduado em Processo Civil pela FGV-LAW

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos