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A participação do psicólogo assistente técnico na perícia psicológica

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28/10/2022 às 17:10
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5. CONSEQUÊNCIAS DA NÃO PARTICIPAÇÃO E ALTERNATIVAS POSSÍVEIS

A ausência de acesso dos Assistentes Técnicos aos procedimentos periciais pode, além de comprometer a qualidade da perícia, configurar cerceamento de defesa, na medida em que o seu papel é exatamente garantir os princípios do contraditório e da ampla defesa, conforme prevê o art. 466 do Código de Processo Civil:

§2º O perito deve assegurar aos assistentes das partes o acesso e o acompanhamento das diligências e dos exames que realizar, com prévia comunicação, comprovada nos autos, com antecedência mínima de 5 (cinco) dias.

Além disso, conforme bem salienta Groeninga, a ausência de acesso às entrevistas periciais dificulta o trabalho do psicólogo assistente técnico, que chega, muitas vezes, a ser cerceado pela falta de acesso às partes, tendo sua credibilidade diminuída.

A doutrina jurídica apoia esse entendimento, no sentido de afirmar que a atuação do Assistente Técnico deve ser ativa durante a perícia, já que somente impugnar o laudo pericial não é suficiente para atender ao princípio do contraditório, devendo-se facultar às partes uma ampla participação, inclusive com objetivos fiscalizadores, durante toda a fase de produção da prova pericial (NEVES, D. apud PAULINO, 2019). A análise do laudo, por si só, não permite que haja a verificação do fiel cumprimento da metodologia e dos procedimentos adotados pelo Perito.

Tal participação, caso seja entendida pelo Perito como interferência nos procedimentos periciais, pode ocorrer por meio de formas alternativas, tais como o acesso dos Assistentes Técnicos à gravação das entrevistas e o acesso digital aos demais instrumentos utilizados, como os testes psicológicos, por exemplo, sempre com compromisso de sigilo.

No sentido de viabilizar uma integração entre as duas normativas, Rovinski (2013, p. 40) afirma que: condutas que possam minimizar a falta de controle por parte do assistente técnico em relação ao trabalho do perito, sem, contudo, interferir nos procedimentos por ele empregados, de modo que as alternativas seriam, por exemplo, a disponibilização pelo perito ao(s) assistente(s) técnico(s) da gravação em áudio e/ou vídeo das entrevistas, bem como dos protocolos e resultados brutos dos testes psicológicos aplicados, visando a possibilidade de análise, por parte desse(s) assistente(s), da qualidade da aplicação dos métodos e das inferências sugeridas pelo perito e garantindo maior transparência ao processo.


6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A perícia psicológica, como um dos meios de prova previstos pelo Código de Processo Civil, é uma das formas mais eficazes de averiguar questões subjetivas e relacionais envolvidas em muitos processos judiciais, especialmente aqueles que envolvem conflitos familiares. É por esse motivo que essa prova, que se diferencia por ser um olhar técnico, realizado por um especialista na área, acaba tendo muito impacto na tomada de decisão dos juízes.

Dada a importância de zelar-se pela qualidade da prova pericial psicológica, o trabalho dos assistentes técnicos torna-se essencial. São esses profissionais, da mesma área dos peritos, que poderão verificar se os procedimentos adotados foram adequados, bem como se as normas técnicas e o construto teórico no qual foi embasado o trabalho estão dentro do que é exigido para o seu trabalho.

Para que a atuação do psicólogo assistente técnico seja mais efetiva, porém, o acesso aos procedimentos periciais é fundamental. Mesmo previsto no Código de Processo Civil4, tal acesso foi vedado por Resolução do Conselho Federal de Psicologia desde 2010.

Considera-se, entretanto, que tal vedação não seja um impeditivo irrestrito para o acesso do psicólogo que atua como assistente técnico aos procedimentos periciais, já que existem meios alternativos como salas de espelhos, gravações por vídeo ou áudio, dentre outras possibilidades a serem estudadas que podem, sem infringir a determinação do Conselho Federal de Psicologia, permitir que o trabalho seja feito da melhor forma possível, garantindo a maior qualidade da perícia: verdadeiro papel do profissional assistente técnico.


REFERÊNCIAS

BENTO, R. et al.; organizado por Andreia Calçada; MARQUES, Marisa. A Perícia Psicológica no Brasil. Rio de Janeiro: Fólio Digital, 2019.

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 16 mar. 2015.

BRAZIL, G. B. de M. (2019). Escritos de Direito de Família Contemporâneo. Alienação Parental e Falsas Memórias. Coordenador por Conrado Paulino da Rosa, Delma Silveira Ibias e Diego Oliveira da Silveira. Porto Alegre, IBDFAM/RS, p. 153-169.

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução CFP nº 008/2010. Dispõe sobre a atuação do psicólogo como perito e assistente técnico no Poder Judiciário. Brasília: CFP, 2010.

GOLDSTEIN, J., Freud, A. & Solnit, J. Tradução: Luis Claudio de Castro e Costa. No Interesse da Criança? São Paulo: Martins Fontes, 1987.

GROENINGA, G. (2016). Importância do psicólogo nas perícias é reconhecida pelo Código de Processo Civil. Revista Consultor Jurídico, 10 de julho de 2016.

HUTZ, C. S. , org. [et. al.] Avaliação psicológica no contexto forense. Porto Alegre: Artmed, 2020.

PAULINO, C. (2019). Guarda compartilhada coativa: efetivação dos direitos de crianças e adolescentes. 2. Ed. Salvador: Juspedivm.

PEREIRA, R. da C. Princípios fundamentais norteadores do Direito de Família. Belo Horizonte: Del Re, 2006.

Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2016-jul-10/processo-familiarimportancia-psicologo-pericias-reconhecida-cpc>. Acesso em 28 de junho de 2021.

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ROVINSKI, S. L. R. (2013). Fundamentos da perícia psicológica forense. 3. ed. São Paulo: Vetor.

SILVA, D. M. P. da. (2003). Psicologia jurídica no processo civil brasileiro: a interface da psicologia com direitos nas questões de família e infância. São Paulo: Casa do Psicólogo.

______ (2011). Guarda compartilhada e síndrome de alienação parental: o que é isso? 2. ed. rev. E atual. Campinas: Armazém do Ipê.

______ (2019). Psicologia jurídica no processo civil brasileiro: questões dos litígios familiares em varas de família. Vol. 2, 4 ed. rev. E atual. Curitiba: Juruá.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARNI, Luciana Generali. A participação do psicólogo assistente técnico na perícia psicológica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 7058, 28 out. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/100671. Acesso em: 11 mai. 2024.

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